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Élida Rafisa
Élida Rafisa
Coordenadora de Gestão Ambiental
O Ensino de Química para Estudantes Surdos: A Formação dos Sinais
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Publicado em 2012
XVI Encontro Nacional de Ensino de Química (XVI ENEQ) e X Encontro de Educação Química da Bahia (X EDUQUI) Salvador, BA, Brasil
Élida Rafisa
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Resumo

Com a formulação de novas leis de inclusão escolar, barreiras têm sido encontradas para o publico surdo. Quando se trata do ensino de química, os contextos os saberes ficam cada vem mais restritos a esse publico que historicamente já fora tão marginalizado, os Surdos. Nisto este trabalho visa discutir teoricamente a formação dos sinais para o ensino de química e os sinais já existentes e como ira influenciar no processo de Ensino-aprendizagem do aluno surdo

Introdução

Em nossa Constituição trata da igualdade entre os homens com relação aos seus direitos, onde há pouco tempo excluía-se os deficientes na educação, tratando-os como diferentes, e apenas possibilitando a aprendizagem apenas em alguns casos e nas escolas especiais ou quem possuísse um melhor poder aquisitivo. Com a regulamentação da Lei nº 10.436 de 24 de abril de 2002, que se dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS, ficou clara esta inclusão escolar da criança desde os primeiros anos, seja pública ou privada, com o direito a educação e oportunidades iguais aos que nasceram sem nenhuma deficiência.

Tratando do capítulo V, da LDB (Lei de Diretrizes e Bases) de 96, fala que a educação especial é uma modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para portadores de necessidades especiais, significa que deverá ser fomentada a esses estudantes uma aprendizagem escolar regular. A Educação Inclusiva tem passado no Brasil por um momento singular, na qual se faz uma reflexão sobre as práticas inclusivas. Isto se deve as novas leis implantadas e as mudanças de atitude que tem se estabelecido ao longo do tempo.

Ao que está assegurado pela legislação vigente no que diz respeito à Educação Inclusiva, vê-se a linha entre o real e o ideal. Admirados com as mudanças permanentes num contexto altamente competitivo e globalizado, os cidadãos, muitas vezes, encontram-se entregues à força dos apelos da mídia ou das manipulações disfarçadas. Se pensarmos apenas nas pessoas ditas “normais”, a situação já é no mínimo assustadora. Tal quadro se intensifica ao analisarmos a situação dos surdos.

O professor não capacitado encontra significativas barreiras na comunicação com o estudante surdo, assim o intérprete se torna imprescindível para que junto com o professor propiciar a construção do conhecimento que leve o estudante a execução de seus direitos na sociedade. A não formação correta de profissionais complica-se diante de uma inclusão feita com pouco ou nenhum apoio especializado, salas de aula superlotadas e a supervalorização da escrita e da norma culta da Língua Portuguesa.

A escola, principalmente a pública, tem o papel de formar para a atuação dos direito e deveres do cidadão, cabe ao intérprete, que por sua vez o professor não se encontra preparado para atender os estudantes surdos. Se o estudante surdo não se comunica eficientemente, em sala e na sociedade, a essência do processo educativo fica comprometida.

Marchesi destaca sobre o do desenvolvimento intelectual da criança surda com o da criança ouvinte:

Devemos sempre lembrar que o desenvolvimento intelectual não depende do desenvolvimento linguístico. A criança surda alcança o mesmo nível de desenvolvimento que a criança ouvinte, e as dificuldades encontradas durante a aprendizagem podem ser devido à deficiência no conjunto de experiências vividas pelo surdo. Dentro desse contexto, é necessário considerar a importância da Língua de Sinais para a educação e para o desenvolvimento da pessoa surda por ser sua primeira língua. É através de sinais que o surdo pode se comunicar, compreendendo com mais facilidade o mundo e participando da comunidade em que vive. Para crianças surdas, é muito importante a aquisição dos sinais logo nos primeiros anos de vida, pois a aquisição e interiorização de um código linguístico é um fator fundamental para a interação social e para a aquisição dos conceitos (MARCHESI, 1987).

Um fato que precisa ser ressaltado é a inclusão dos estudantes Surdos na sala de aula e em todas as temáticas que por ela perpassam. Isso tem sido dificultoso, pois não temos disponíveis os sinais dos quais são necessários para a comunicação e crescimento do conhecimento cientifico dos mesmos. Para buscar uma interação da LIBRAS com a Química, é necessário um relacionamento diário tornando comum o uso da LIBRAS.

A inserção da linguagem de sinais no contexto do Ensino de Química, tem sido trabalhada há pouco tempo. Viu-se a necessidade das pessoas surdas entrarem neste novo mundo de descobertas. A dificuldade do ensino-aprendizagem com surdos é estritamente igual ao de pessoas ouvintes. São pessoas dotadas também do intelecto, então tem capacidades normais de aprendizagem.

Formação dos Sinais

Brito (1995) em seus estudos, destacou aspectos relevantes a constituição da LIBRAS. Ela expos três parâmetros primários que se combinam: a Configuração das Mãos (CM), o Ponto de Articulação (PA) e o Movimento (M). A CM é o modo que está posicionado os dedos, a maneira que a mão está, ou as duas mãos (conforme o sinal). A LIBRAS apresenta 46 CM, e variam quanto às posições dos dedos, desde a mão com os dedos todos abertos até os dedos fechados, e variam quanto a posição em que a mão está.

Com isso, Brito (1995) afirma que:

Os sinais são formados a partir da combinação do movimento das mãos com um determinado formato em um determinado lugar, podendo este lugar ser uma parte do corpo ou um espaço em frente ao corpo. Estas articulações das mãos, que podem ser comparadas aos fonemas e às vezes aos morfemas, são chamadas de parâmetros.

Portanto, nos Sinais podem ser encontrados os seguintes parâmetros, segundo Brito (1995):

  1. Configuração das mãos: são formas das mãos, que podem ser da datilologia (alfabeto manual) ou outras formas feitas pela mão predominante (mão direita para os destros), ou pelas duas mãos do emissor ou sinalizador. Os sinais APRENDER, LARANJA e ADORAR tem a mesma configuração de mão;
  2. Ponto de articulação: é o lugar onde incide a mão predominante configurada, podendo esta tocar alguma parte do corpo ou estar em um espaço neutro vertical (do meio do corpo até à cabeça) e horizontal (à frente do emissor). Os sinais TRABALHAR, BRINCAR, CONSERTAR são feitos no espaço neutro e os sinais ESQUECER, APRENDER e PENSAR são feitos na testa;
  3. Movimento: os sinais podem ter um movimento ou não. Os sinais citados acima tem movimento, com exceção de PENSAR que, como os sinais AJOELHAR, EM-PÉ, não tem movimento;
  4. Orientação: os sinais podem ter uma direção e a inversão desta pode significar idéia de oposição, contrário ou concordância número-pessoal, como os sinais QUERER E QUERER-NÃO; IR e VIR;
  5. Expressão facial e/ou corporal: muitos sinais, além dos quatro parâmetros mencionados acima, em sua configuração tem como traço diferenciador também a expressão facial e/ou corporal, como os sinais ALEGRE e TRISTE. Há sinais feitos somente com a bochecha como LADRÃO, ATO-SEXUAL.

Na combinação destes cinco parâmetros, tem-se o sinal. Falar com as mãos é, portanto, combinar estes elementos que formam as palavras e estas formam as frases em um contexto. (Revista da FENEIS, 1999/2002)

A formação de professores de Química e a Educação de Surdos

A educação inclusiva de surdos no final do século XX tinha a oralização como fundamento na comunicação, não existia a figura do intérprete em sala de aula e os surdos eram discriminados e marginalizados pela grande maioria das pessoas justamente por não saberem como lidar com a criança surda, onde este aspecto so vinha a findar que a deficiência e o atraso na aprendizagem não se tratava por conta do aluno e sim pelo sistema de educação vigente (modelo vertical) e o despreparo do profissional da educação, em suas licenciaturas.

Os saberes docentes eram baseados na criatividade e na sensibilidade pessoal e quem deteve este conhecimento, se mantinha manipulador das tendências pedagógicas, fato que, ainda se observa na maioria dos conteúdos curriculares dos cursos de formação de professores e educação continuada, num modelo conceituado como terapêutico por se reconhecer e valorizar os aspectos nosológicos e medicamentosos cujo conteúdo se apresenta híbrido e monopolizado e por vezes manipulador como formador de opinião (CICCONE, 1996).

Uma alternativa para o equilíbrio no conhecimento cientifico é a comunicação dos surdo é propriamente dita a universalização da LIBRAS e a sua oficialização nos cursos de formação de professores e demais cursos de educação, licenciaturas e fonoaudiologia. Os centros de formação e as universidades recebem a responsabilidade de transpor este modelo casuístico e conteudista, contudo, o arcervo de profissionais preparados para a formação ainda é escasso ocasionando ate o desinteresse próprio do licenciandos na educação de surdos. Os recursos humanos são insuficientes e inoperantes para atender ao mercado.

Eis o dilema: não existem surdos (qualificados para o ensino superior) para a educação de surdos. São muitas dificuldades por falta de surdos nos cursos universitários e de pós-graduação. Pela falta de adequação curricular, muitos desistiram por não conseguirem transpor a barreira da formalização dos conhecimentos através da escola. A responsabilidade do ensino dos surdos ainda vai permanecer por muito tempo nas mãos dos ouvintes, segundo o modelo universitário vigente no país, a formação de professores ouvintes fluentes em Libras permanecem assumindo este ensino até que algum dia os surdos consigam, de forma universal assumir o seu papel social de professor e pesquisador universitário (FALCÃO, 2007).

LIBRAS e terminologias Químicas

Em pesquisas atuais, as terminologias para o ensino de química tem sido uma barreira para a construção do conhecimento cientifico em temáticas da Química. Sabendo–se da importância real da LIBRAS para a comunicação dos surdos Silveira e Marques (2010) expuseram sobre sinais já existentes em terminologias para o ensino de química. Então seguindo o modelo por eles expostos elucida-se abaixo as categorias e os sinais:

  1. Materiais Químicos: aço, açúcar, água, álcool, alumínio, ar, bronze, cloro, combustível, espuma, ferro, gás, gelo, glicose, ouro, oxigênio, pilha, plástico, prata, sais de cálcio, sais de cozinha, sais de ferro, sais de flúor, sais de iodo, sais de magnésio, sais de potássio, sais de fósforo, vinagre;
  2. Processos Químicos: aquecer, calor, congelar, derreter, desidratação, ebulição, efervescente, esfriar, fervura, filtração, frio, inflamar, misturar, padronizar, queimar, secar, transferir;
  3. Instrumentos Laboratoriais: espátula, funil, imã, pilha;
  4. Outros Termos: átomo, ciências, doce, eletricidade, equilíbrio, ferrugem, fumaça, gasoso, modelo, negativo, positivo, química.

Entretanto a discussão dos Sinais ainda não vem pela disponibilidade deles em dicionários, e sim pela variação de região (regionalismo) e por conseguinte de países. Por mais que seja criado um novo sinal , com a presença do professor e do interprete, precisa-se que este mesmo sinal seja padronizado para todos, fazendo com que a fluência da língua não varie tanto dificultando ate mesmo a aprendizagem em diferentes regiões.

Silveira e Marques (2010) ainda destacam que a contribuição do professor de química na criação do sinal é fundamental para um adequado entendimento dos conceitos desta ciência e que a criação do sinal apenas facilita a transmissão do conteúdo para o surdo, não garantindo que haverá uma maior aprendizagem por sua parte na simples utilização deste verbete de LIBRAS.

Os saberes Químicos para alunos surdos

A aprendizagem de alunos surdos tem sido tradicionalmente encarada de acordo com as habilidades de comunicação expressiva e receptiva. Concebida como privação da audição, a surdez tem, nesse impedimento de acesso aos sons da fala, a principal dificuldade de aquisição da linguagem (BENITE, PEREIRA E BENITE, 2011). Segundo Guarinello (2007, p. 35), “a concepção de linguagem fica limitada à fala e o surdo tem problemas com aquisição da linguagem porque não escuta”. No contexto da aula de química, é possível dizer que as dificuldades dos surdos se estabelecem porque são as línguas orais as únicas utilizadas pelos educadores (Benite et al., 2008).

Vigotski (1997),investigou o desenvolvimento da aprendizagem a partir dos pressupostos gerais sobre o desenvolvimento das funções psicológicas, buscando melhor compreender e definir, colocando em discussão as implicações dos aspectos socioculturais e afetivos. De acordo com Vigotski (1997), sem a linguagem, a inteligência da criança permanece uma capacidade puramente prática, natural, semelhante a dos animais, como os macacos. Portanto o desenvolvimento cognitivo é fundamentalmente uma função da ampla interação verbal que ocorre entre crianças e adultos. Por meio dessas interações a criança desenvolve a linguagem e como consequência o pensamento lógico. O autor trata o pressuposto de que o desenvolvimento da criança em situação de deficiência é a mesma da criança “normal”. Com isso, a criança surda não é uma criança menos desenvolvida, mas uma criança que se desenvolve de maneira diferente.

Segundo Benite et al (2008) o que diz respeito ao ensino de química, o aluno ouvinte se apropriará dos conceitos químicos por meio de informações que recebe do meio, principalmente por intermédio da audição. Desse modo, o aluno surdo fica em desvantagem com os demais, porém o professor, por meio de uma prática pedagógica redirecionada, poderá ajudá-lo de maneira objetiva a se apropriar desses conceitos.

Metodologia

Os sinais já existentes dão boa parte da comunicação entre surdos e ouvintes. O paradigma que se vem enfrentando são os sinais disponíveis para esta comunicação quando se é trabalhado a disciplina de Química. A isonomia entre a Química e a LIBRAS tem sido uma árdua tarefa de anos, pois a criação de novos sinais e disponibilizá-los leva tempo e é necessário que seja integrado ao dicionário.

O presente trabalho visa discutir a formação destes sinais salientando a comunicação dos Surdos via LIBRAS e os contextos já existentes para a abordagem química e por fim as dificuldades encontradas até hoje neste processo de ensino aprendizagem.

Resultados e discussão

Observamos que o processo de construção linguística é complexo, principalmente pela diferença de modalidade da língua de sinais em comparação à língua portuguesa. Ou seja, o surdo em sua escrita terá aspectos quem devem ser levados em consideração: Os verbos se apresentam no infinitivo, não existe pronomes, a escrita deve acompanhar a estrutura gramatical da LIBRAS. Respeitando estes aspectos, teremos não somente uma inclusão escolar e social efetiva, mas uma melhora no desenvolvimento escolar do aluno surdo.

Mesmo com esta iniciativa, o sentido científico ainda se mantém na superficialidade, sabendo da dificuldade de expressarmos alguns contextos. Não há como definir um modelo único para o ensino ao surdo, entretanto, a incorporação da linguagem de sinais no ensino de química pode contribuir para um melhor processo da construção de conhecimento.

Do ponto de vista pedagógico, temos consciência que falta toda uma construção de proposta de ensino pautada no processo de aprendizagem do surdo. É deveras surpreendente constatar que os instrutores, ainda com formação incipiente para o ensino das disciplinas regulares, utilizem métodos que primam pela comunicação, princípios de métodos ora funcionalistas, constroem situações sociais onde na interação é produzida a negociação de significados.

O fator mais importante, porém, é a necessária mudança de atitude do linguista diante de sua pesquisa, abandonando a ilusória neutralidade diante de seus “informantes”, e tendo que se envolver com os problemas psicossociais e educacionais dos surdos. É evidente que quando o pesquisador é surdo, quando sua língua nativa é a Língua de Sinais, todos os fatores acima descritos terão um maior aprofundamento.

A própria existência do processo requer o planejamento que se direcione a responder às dúvidas e “erros” dos alunos. A propósito, os dados compilados neste estudo servem de base para a organização de algumas aulas, para que esses conteúdos sejam apresentados de forma explicita.

Conclusão

A LIBRAS, portanto, assume um papel linguístico de permitir a comunicação, a interação social e a constituição da própria personalidade. É uma característica diferenciadora dos animais. A LIBRAS como língua oficial é patrimônio da população brasileira, este status deve ser garantido não apenas por Decreto, mas acima de tudo, como motivação societária e sua utilização deve ser assumida em todos os currículos escolares e em todas as salas de aula como disciplina regular, tão mais do que as línguas estrangeiras, servindo de atributo social, político, econômico e cultural da população.

Bibliografia

BRITO, L. F. Por uma Gramática de Língua de Sinais. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro. 1995.

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BENITE, A.M.C.; NAVES, A.; PEREIRA, L.L.S. e LOBO, P. Parceria colaborativa na formação de professores de ciências: a educação inclusiva em questão. In: GUI-MARÃES, O.M. (Org.). Conhecimento químico: desafios e possibilidades na ação docente. ENCONTRO NACIONAL DE ENSINO DE QUÍMICA. Curitiba: Imprensa Universitária da UFPR, v. 1, p. 1-12, 2008.

VIGOTSKI, L. S. Obras Escogidas V: fundamentos de defectología. Madrid: Gráficas Rogar, 1997.

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