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Maria do Céu Gomes
Maria do Céu Gomes
Professora
Português Segunda Língua: A importância do trabalho colaborativo
Inserido Quarta-feira, 18 de Setembro de 2013
Autor: Maria do Céu Gomes
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Sendo o português transversal a todas as áreas curriculares assume especial relevância o trabalho colaborativo entre os professores e técnicos que constituem uma equipa educativa. Neste processo, não há contributos mais relevantes do que outros. Todos são importantes e essenciais para o desenvolvimento dos alunos surdos.

Muitas vezes há projetos que falham ou que não atingem os resultados almejados devido à falta de coesão nas equipas educativas. De facto, nem sempre existe um espírito de entreajuda e colaboração que una todos em torno de um objetivo comum.

Em geral, os alunos surdos apresentam várias lacunas:

  • falta de informação e de conhecimento do mundo
  • falta de comunicação com a família e sociedade ouvinte
  • falta de um conhecimento sólido da LGP
  • falta de conhecimentos de português

Como é fácil depreender, todos estes eixos estão relacionados. Se um aluno nasce surdo ou fica surdo nos primeiros anos de vida, não vai conseguir desenvolver uma língua vocal. Se o acesso à língua gestual lhe for vedado ou facultado de forma irregular e inconsistente, ele vai crescer sem uma língua estruturada. Isso vai afetar a sua comunicação quer com a família, quer com a sociedade que o rodeia. O seu isolamento comunicativo vai impedi-lo de aceder a muitos conhecimentos que os ouvintes adquirem de forma inconsciente. Vai também dificultar a aquisição de uma segunda língua.

Quando um professor tem à sua frente um aluno surdo não pode pressupor que ele tem os mesmos conhecimentos e experiência de vida de um aluno ouvinte. Assim, o primeiro passo é conhecê-lo. Se um professor dominar bem a língua gestual, pode interagir diretamente com o aluno. Se não for esse o caso, assume especial relevância o papel do intérprete. Este profissional não pode, pois, ser encarado como um mero tradutor de conteúdos. Ele é uma peça crucial para que se possa chegar ao aluno e conhecer as suas experiências de vida, o conhecimento que tem do mundo, bem como o seu nível de desenvolvimento cognitivo e linguístico. Esta avaliação diagnóstica deve preceder a definição do programa educativo de cada aluno. O professor não pode limitar-se a dar o programa previsto para um determinado ano de escolaridade, fazendo tábua rasa do tipo de aluno que tem à frente.

Este trabalho de diagnóstico deve ser contínuo, cada vez que se inicia um novo conteúdo ou uma nova etapa. Devemos ter a preocupação constante de aferir se o aluno sabe do que é que estamos a falar, se o aluno sabe o significado do gesto ou da palavra que estamos a utilizar. Este conhecimento adquire-se através da interpelação do aluno, da observação das suas reações e dos seus registos. O contributo do intérprete de LGP é fundamental para a construção deste conhecimento.

Ao serem identificadas lacunas no aluno, estas devem ser partilhadas com o docente de LGP, que as pode trabalhar na sua aula, de forma interdisciplinar. Um aluno não sabe, por exemplo, distinguir os conceitos de passado, presente e futuro. O docente de LGP saberá, melhor do que ninguém, explicar isto ao aluno. Se existir partilha e colaboração, o aluno poderá ir clarificando as suas dúvidas.

Um outro problema que afeta os alunos surdos é a dificuldade de memorização. Como o português escrito é utilizado quase exclusivamente no contexto da sala de aula, acaba por não ser adquirido de forma sólida. Tão depressa a palavra ou expressão é aprendida, como é esquecida.

É, por isso, importante que um mesmo tema ou conteúdo seja trabalhado em diferentes contextos e por diversos profissionais, tais como o professor de educação especial e o terapeuta da fala. A antecipação e o reforço podem ajudar o processo de memorização do aluno.

Por último, não podemos esquecer o papel da família. A escrita não pode ser exigida apenas no contexto escolar. É importante que os pais e encarregados de educação acompanhem o processo formativo dos seus educandos e os façam colocar em prática os conhecimentos adquiridos. Tal pode ser conseguido através da escrita de recados, mensagens de telemóvel, correio eletrónico, listas de compras, etc.

A experiência mostra que o trabalho colaborativo é essencial. Todos têm um papel que não pode ser secundarizado. Importa, pois, a articulação em torno do que mais importa – o aluno.

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