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Ouça o Silêncio: Em filme, um menino surdo descobre o poder da música
por porsinal     
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Domingo, 23 de Fevereiro de 2020 às 00:00:00
Ouvir não é só com os ouvidos, e sim com o corpo todo. Essa é a descoberta do menino Luka, de nove anos, neste documentário que é pura aprendizagem.

Luka é um menino de nove anos que vive e estuda numa escola pública para crianças surdas e/ou com deficiência auditiva. Surdo e apresentando dificuldades de concentração, ele atravessa as questões específicas da idade – dúvidas, medos e inseguranças – somado ao fato de ser uma criança que não consegue interagir com o mundo por meio da linguagem oral. Então, Luka dá-se conta de que precisa ir buscar outras maneiras para se comunicar e, assim, ser ouvido.

Esse é o enredo central da longa documental “Ouça o silêncio” (Listen to the silence).

No filme, o menino estabelece uma relação de troca com a música e a dança, em que os sons o fazem perceber como é possível ouvir o mundo através do corpo todo, e não só do ouvido.

Produzido em 2016, com direção e roteiro da cineasta Mariam Chachia, o documentário passa-se na Geórgia, na Europa Oriental, e acompanha a jornada de crescimento e desenvolvimento de Luka. “O filme é um convite para ouvir o silêncio, para escutar a música que existe no silêncio”, afirma Muskat, “A música é uma linguagem universal que é intrinsecamente emocional e empática”, defende.

Ter um sonho é muito natural e fácil para cada um de nós, mas, para segui-lo, quando ninguém mais acredita nele, é o destino de apenas alguns”, diz a sinopse do documentário, que narra o mundo interno deste menino que só deseja ser ouvido. “Mesmo que seja muito difícil para ele entender e aprender o ritmo da música, ele nunca desiste. Listen to the Silence observa a vida de Luka no mundo oculto dessa sociedade surda”.

A partir da relação que os adultos constroem com o menino, o filme provoca a pensar como a diferença é percebida e tratada, até mesmo num contexto em que a diferença é pressuposto, como a escola de Luka, onde todas as crianças possuem deficiência auditiva. Por não se enquadrar no que o entorno social considera “normal”, Luka é muitas vezes vezes tido como desajustado, aquele não que acompanha o ritmo dos demais, e é dessa forma que ele se sente. Em muitos contextos de patologização da infância, o menino seria rotulado como hiperativo, ou com algum transtorno de atenção.

Enquanto muitos dos seus colegas – também crianças surdas – conseguem repetir os passos que o professor ensina, Luka tem dificuldade, erra, frustra-se e, num dado momento, resolve desistir de tentar. No tempo livre entre uma aula e outra, o filme mostra o garoto treinando sozinho, ou arranjando confusão com outras crianças. O menino tem muita energia, e nem sempre as atividades que lhe são dadas conseguem dar conta de canalizar todo esse potencial.

Diante disso, não só os seus pais, mas também os professores e coordenadores da escola, aparentam estar perdidos em relação aos rumos da educação do menino, já que nada parece fazê-lo ser mais disciplinado ou focado. Em diversas cenas, essa desajuste em relação ao que é esperado e normalizado se reflete na maneira como o menino lida com a frustração por não conseguir reproduzir algum comportamento, apresentando ainda mais agressividade ou rebeldia.

É a partir da relação com a música – e a musicalização, de forma mais abrangente – que Luka experimenta fazer parte de um grupo. Ele participa das aulas com entusiasmo, mesmo errando constantemente, e logo começa a tomar gosto por aquilo, passando a sonhar com palcos e apresentações de dança.

O filme trabalha a questão da música como uma linguagem complexa, que vai além da percepção dos sons. Ou seja, como uma criança surda se conecta com a música sem conseguir ouvi-la? A partir de cenas subtis e de grande beleza, o filme coloca essas interrogações curiosas ao espectador, como naquela em que Luka se tranca sozinho na sala de ensaio e liga o aparelho de som. Por longos minutos, ele acaricia as caixas de som, sente a vibração da música, tira e põe da tomada, investigando a existência física do som.

Segundo o professor, que também é músico e compositor, o potencial da música para o desenvolvimento humano está relacionado à subjetividade que ela evoca, favorecendo a construção da identidade e do sentimento de cocriação diante daquilo que o som representa.

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