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Neuma Chaveiro
Neuma Chaveiro
Fonoaudióloga
Educação bilíngue para surdos em Barcelona - Espanha
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Publicado em 2020
Revista The Especialist, v. 41, n. 1
Neuma Chaveiro
Dolors Rodríguez-Martín
Juliana Guimarães Faria
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Resumo

O objetivo é descrever a educação bilíngue de surdos, por meio da visão advinda da família e da educação. Possui abordagem qualitativa descritivo-analítica. Contou com 3 participantes: uma mãe de surdo, uma surda com formação em licenciatura e fonoaudiologia e uma professora ouvinte, pesquisadora na área de Língua de Sinais (LS). A análise dos dados indica três categorias: 1) Educação Bilíngue – empoderamento dos surdos; 2) Saúde – Reverberações da oralização no processo educativo; 3) Família – interface com a educação bilíngue. Percebe-se que a educação bilíngue de surdos em Barcelona vive um momento de ressignificação, de busca pela valorização da LS, no entanto, não descartam os benefícios do implante coclear, embora se tenha plena consciência que o “implante coclear não é um milagre”. Conclui-se que há o surgimento na educação bilíngue de um novo perfil sociocultural da pessoa surda: o surdo bilíngue implantado.

1. Introdução

Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística da Espanha (INE), o país tem uma estimativa de 967.445 pessoas com perda auditiva, e um total superior a 400.000 pessoas que se comunicam pela Língua de Sinais Espanhola (LSE). Nesse número estão incluídas todas as pessoas que utilizam a LSE, seja por motivos familiares, afetivos ou de trabalho (INE, 2019).

O Estado Espanhol é divido em 17 Comunidades Autônomas e duas cidades Autônomas. A cidade de Barcelona é a capital da Comunidade Autônoma da Catalunha, considerada a segunda cidade mais populosa do Reino da Espanha. O Instituto de Estatística de Catalunha registra 555.439 pessoas com deficiência, podendo ser física, sensorial ou mental, e um número de 31.320 pessoas que se reconhecem com algum grau de perda auditiva. Isso representa 0,41% da população do território Catalão; sendo que na cidade de Barcelona está concentrado o maior número de pessoas surdas, com 11.161 surdos (IDESCAT, 2019).

A Espanha tem duas línguas de sinais (LS) reconhecidas oficialmente, a Língua de Sinais Espanhola (LSE) e a Língua de Sinais Catalana (LSC). No que se refere à regulamentação oficial da LSE, o país a reconhece pela Lei 27/2007; e a LSC foi regulamentada oficialmente pela Lei 17/2010 (RODRÍGUEZ-MARTÍN, 2016). A LSC é assim definida: “A língua de sinais catalana como sistema linguístico próprio de pessoas surdas e surdocegas na Catalunha” 4 (COMUNIDADE AUTÓNOMA DE CATALUÑA, 2010, p. 1, tradução nossa).

A educação bilíngue tem aproximadamente 25 anos de implementação em Barcelona, sendo vista como uma modalidade educacional na Lei 17/2010. A referida Lei faculta às pessoas surdas o direito à escolha entre a modalidade educacional oralizada ou modalidade educacional bilíngue. Conforme consta no Capítulo I, que trata das disposições gerais, a modalidade educativa bilíngue é vista como aquela em que a LS é utilizada tanto como objeto de estudo e no processo comunicacional, como língua de acesso ao conteúdo curricular; ainda, na educação bilíngue, coexistem a LS e a língua oral e escrita, esta última, vista como objeto de aprendizagem, assim conceituada:

Modalidade educativa bilíngue: o projeto educativo em que coexistem a língua de sinais catalã, como objeto de estudo e linguagem veicular na comunicação e acesso ao currículo escolar, e as línguas oficiais orais e escritas, que também são objeto de aprendizagem 5 (COMUNIDADE AUTÓNOMA DE CATALUÑA, 2010, p. 6, tradução nossa).

Este artigo tem como tema a educação bilíngue para surdos no contexto da cidade de Barcelona. O objetivo geral do estudo é descrever o processo educacional de surdos numa perspectiva bilíngue, por meio da visão advinda da família e do contexto educacional.

2. Língua de sinais no contexto da educação bilíngue

Compreende-se que para se obter êxito numa proposta de educação de surdos, a LS deve ser o eixo central. Reconhecer que a aquisição da LS se dá de modo natural pelos surdos e que é uma língua com todos os itens linguísticos, sendo a primeira língua (L1) dos surdos, faz com que a LS tenha o valor que lhe é devido, como uma das marcas da identidade e cultura da população surda. Assim, é necessário utilizá-la como meio de comunicação e interação no ambiente escolar, bem como deve ser adotada em toda proposta de ensino-aprendizagem para surdos.

De acordo com Gesser (2007), as LS são línguas naturais, utilizam o canal vísuo-espacial, são difundidas e utilizadas por comunidades surdas através de gerações. Essas línguas são divergentes dependendo do País ou de uma determinada região e tem estruturas gramaticais completas, independentes das línguas orais. No arcabouço linguístico, as LS possuem todas as características das línguas de modalidade oral.

Quanto à aquisição da LS pelos surdos, não há de dúvidas que ela acontece por meio da exposição natural, sem barreiras, porque é a língua que o surdo tem condições de adquirir em contato com outros surdos. Por isso, numa proposta bilíngue de educação, há que se considerar a idade que o surdo tem acesso à LS. Muitos surdos são filhos de pais ouvintes e têm o seu primeiro contato com a LS somente na escola, em torno de 5 anos de idade, o que é considerado tardio, visto que o período crítico de aquisição de uma língua se completa nessa faixa etária. Assim, a depender da idade em que o surdo for exposto a LS irá determinar a sua fluência e também o seu desempenho linguístico nesta língua (CHOMSKY, 2005; BIZIO 2014).

Outro ponto a se considerar na aquisição de uma língua, e que é determinante para o êxito no processo educacional, é o desenvolvimento das habilidades cognitivas, que é propiciado pela aquisição plena de uma língua a nível inconsciente, por meio das relações estabelecidas entre as pessoas. No caso dos surdos de famílias ouvintes, há que se buscar alternativas para garantir o acesso à LS e, assim, possibilitar o desenvolvimento cognitivo, linguístico e, consequentemente, educacional (QUADROS, 1997).

Nesse sentido, uma proposta de educação para surdos deve postular nas suas práticas pedagógicas um ambiente educacional que proporcione a aquisição da LS o mais precoce possível, em tempo hábil de se garantir ao surdo o seu desenvolvimento cognitivo e suas potencialidades gerais. O quanto antes uma criança surda tiver acesso a sua língua, a LS, mais chances terá de conseguir um bom desenvolvimento e avanços com a educação bilíngue a qual será exposta. Dessa forma, garante-se aos alunos surdos as mesmas possibilidades e condições de sucesso educacional de alunos ouvintes, uma vez que a identidade linguística e cultural está posta como fator de inclusão educacional (CHAVEIRO; SILVA, 2016). Nessa perspectiva, a LS incorporada às práticas educativas levam à possibilidade de se trabalhar um aprendizado bilíngue, no qual a língua oral não é a via exclusiva e protagonista na educação de surdo.

A educação bilíngue para surdos é um tema de discussão recorrente entre comunidade surda, pesquisadores, profissionais da área de educação de surdos e familiares. No entanto, os resultados dessa modalidade de educação bilíngue ofertada aos surdos, e eleita por grande parte dos surdos e de pesquisadores, como a modalidade mais eficaz, não tem apresentado resultados tão satisfatórios quanto aos almejados (DAMMEYER; MARSCHARK, 2016).

Dammeyer e Marschark (2016) pesquisaram o nível de satisfação de surdos na Escandinávia em relação ao programa de educação bilíngue-bicultural. Participaram da pesquisa 408 surdos (adultos e idosos) e identificaram certa insatisfação dessa população, visto que, na vida adulta, a população surda apresentou um nível de escolaridade, conquistas sociais e desempenho cognitivo, significativamente menores se comparados à população ouvinte. Assim, o modelo de educação bilíngue (que trouxe professores surdos, valorização da cultura surda e da língua de sinais) não foi capaz de alterar significativamente a vida dos surdos pesquisados na Escandinávia. Esses dados demonstram a importância de pesquisas que envolvem a educação de surdos, visando estimular o desenvolvimento de novas propostas para influenciar positivamente a vida social das pessoas surdas.

Há aproximadamente 40 anos, a educação bilíngue vem sendo vivenciado pelas pessoas surdas. Desde os anos de 1980, vários países iniciaram uma nova abordagem para os surdos, a educação bilíngue ou bilíngue-bicultural, que busca valorizar a LS e a cultura surda. Ofertar aos surdos uma educação de qualidade e que os permita obter uma escolaridade em nível de igualdade com a população em geral é a aspiração da comunidade surda e científica. Assim, estudar e analisar os resultados dessas práxis pedagógicas na educação dos surdos em diferentes contextos, é de suma importância para direcionar as ações, com vistas a se obter um padrão de excelência na educação dos surdos.

3. Sobre o estudo

Esta pesquisa tem uma abordagem qualitativa de natureza descritivo-analítica por levar em conta as significações do conteúdo, acontecimentos e principalmente sentimentos, atitudes e valores dos entrevistados (MINAYO, 1992). A investigação foi realizada em Barcelona e sedimentada a partir de um panorama de aproximadamente 25 anos de implementação da educação bilíngue e no respaldo legal e político que reconhece a LSC como língua dos surdos.

A amostra da pesquisa contou com 3 participantes que atuam em diferentes cenários e ocupam posições de destaque na educação dos surdos na cidade. O primeiro participante (Participante 1) é uma mãe de um filho surdo e também presidente da associação de famílias de crianças surdas, denominada Volem signar i escoltar e tem uma atuação na defesa do uso da LSC e da educação bilíngue para surdos. O segundo participante (Participante 2) é uma pessoa surda com formação acadêmica em licenciatura e fonoaudiologia, atua como professora e fonoaudióloga de surdos, trabalha numa escola que utiliza a abordagem de ensino bilíngue para surdos, é autora de livros na área de identidade e cultura surda e tem uma ligação com movimentos surdos e defesa da LSC. O terceiro participante (Participante 3) é uma professora ouvinte, investigadora do Departamento de Tradução e Linguística na Universidade Pompeu Fabra, atua em grupos de pesquisa com temas relacionados à LS e educação de surdos e, recentemente, em 2015, defendeu sua Tese de doutorado sobre a modalidade bilíngue na educação com alunos surdos.
A coleta de dados ocorreu durante os meses de fevereiro e março de 2019, por meio de entrevistas, utilizando-se como instrumento um questionário com perguntas semiestruturadas, relacionadas à: a) educação bilíngue de surdos e ao uso da LS; b) interface familiar no contexto educacional bilíngue e da LS; e c) a influência da oralização, ao uso de aparelhos auditivos e ao implante coclear.

Os dados foram coletados em língua espanhola e traduzidos para língua portuguesa pelas autoras desta pesquisa, visto que duas são brasileiras e uma espanhola, e todas fluentes nas línguas que compõem essa investigação. A coleta de dados com a participante surda foi realizada em língua espanhola, pois ela também se comunica pela língua oral. No entanto, para garantir a exatidão da sua fala, durante a coleta de dados, esteve presente uma professora ouvinte fluente na LSC.

Os dados foram tratados com base na abordagem qualitativa e geridos por meio de uma aproximação à Técnica de Análise de Conteúdo Categorial Temática, que “consiste em descobrir os ‘núcleos de sentido’ que compõem a comunicação e cuja presença ou frequência de aparição pode significar alguma coisa para o objetivo analítico escolhido” (BARDIN, 2010, p. 105).

4. Resultados e discussões

Os resultados elucidam o processo educacional dos surdos em Barcelona com base no relato das vivências das participantes desse estudo, com vistas a contribuir com a compreensão do contexto educacional dos surdos num enfoque bilíngue.

O tratamento dos dados coletados, por meio das entrevistas, permitiu identificar sete núcleos de sentidos (BARDIN, 2010), os quais foram distribuídos em 3 categorias temáticas, como pode ser observado no quadro 01. Os núcleos de sentido foram criados a partir de agrupamento de recortes das entrevistas.

Categorias Núcleos de sentidos
Educação bilíngue – empoderamento
dos surdos
- Educação Bilíngue
- Escola
- Língua de sinais
- Privação linguística
Saúde – reverberações do oralismo
no processo educativo
- Saúde e estimulação precoce
- A força do oralismo
Família – interface com a educação
bilíngue
- Família inclusiva

Quadro 1 – Categoria e núcleos de sentidos

A seguir são apresentados os recortes das entrevistas nos seus respectivos núcleos de sentido, seguidos da discussão e análise.

Núcleo de sentido: Educação Bilíngue
A educação não é bilíngue, se tenta, o que existe é uma mescla das duas línguas (...). A Educação bilíngue vive um momento de não progressão, estancamento, não há uma valorização da educação bilíngue (Participante 2).
A maioria dos surdos não tem educação bilíngue, tem chegado tarde a educação em LS, quero dizer que não dominam a leitura e escrita (Participante 1).
Não temos dados suficientes, e isso é muito grave, ou seja, não conhecemos como evoluiu a educação de surdos na Espanha, não temos dados, estamos intervindo, mas não temos dados efetivos. Isso me preocupa, não posso avaliar bem, pois tenho somente alguns indicadores, que me dizem não estamos fazendo as coisas bem e isso me preocupa (Participante 3).
Eu creio que o que nos está dizendo a situação é que não tem evoluído, está pior, por que a energia que havia no princípio, essa participação dos pais, dos professores, tem diminuído, o que é normal, porque os governos que tivemos não têm tomado consciência do especial que era a modalidade bilíngue (Participante 3).

Fonte: Elaborado pelas autoras a partir dos dados
Quadro 2 – Categoria: Educação bilíngue - empoderamento dos surdos

Ao adotar como direito dos surdos a educação bilíngue, deve-se reconhecer a LS como eixo central do processo educativo, e suas ações pedagógicas valorizar os aspectos visuais na educação dos surdos. Assim, pretende-se contemplar a diferença linguística e cultural dos surdos no contexto escolar (BIZIO, 2014).

Os participantes desta pesquisa deixam explícito que a educação bilíngue em Barcelona passa por um período de estagnação, não observam avanços e, principalmente, relatam que há falta de incentivo por parte do Governo e gestores educacionais para impulsionar a educação bilíngue.

Compreende-se que o processo educativo do aluno surdo tem especificidades que se difere do aluno ouvinte. As línguas envolvidas, sinalizada e oralizada, possuem modalidades de produção e recepção diferentes e, consequentemente, o ensino deve considerar essas particularidades, elucidando que a aquisição da língua oral na modalidade escrita para os surdos tem um caráter metalinguístico e não se deve valorizar os aspectos de sonoridade como ocorre com alunos ouvintes (SÁNCHEZ-AMAT, 2015).

As línguas utilizadas na proposta bilíngue têm estruturas gramaticais próprias e distintas, cada língua deve ser utilizada separadamente, com cuidado para que as línguas não sejam sobrepostas, ou seja, utilizadas ao mesmo tempo. Quando isso ocorre, há uma desconfiguração das duas línguas e o receptor, no caso o aluno surdo, não recebe as informações em plenitude, o que compromete no seu aprendizado, desenvolvimento cognitivo e consequentemente desempenho social (FINGER; QUADROS, 2008).

Núcleo de sentido – Escola
O que se vê em Catalunha é que 75% dos alunos surdos estão na modalidade oral, “integrados” (entre aspas) e não utilizam LS, estão em colégios que não há outros surdos, estão com companheiros ouvintes, depois há outra parte, de 9%, que está unicamente na modalidade bilíngue, seja em colégios específicos para surdos, seja em colégios de agrupamento (Participante 3, grifo do participante).
Na Catalunha, quando se diagnostica uma criança com surdez, há dois caminhos, duas instituições que participam na orientação aos pais, uma é no âmbito médico e outra no âmbito educativo. No âmbito médico há alguns hospitais determinados, e o outro âmbito educativos são os CREDAS (Centro de Recursos Educativos para Deficientes Auditivos). Eles diziam que orientavam, informavam as famílias, mas centrada basicamente na modalidade oral (Participante 3).
É uma escola municipal da Prefeitura de Barcelona. É uma escola pequena, é a melhor escola para as crianças surdas de Catalunha. Isso não quer dizer que seja perfeita, porque nenhuma escola não é, mas sim que é a melhor para nossas crianças, e os profissionais, os asseguro que se esforçam muitíssimo (...), eles arregaçam as mangas (Participante 1).
Eu esperava ver as boas práticas para levá-las ao conhecimento da comunidade científica e da comunidade educativa, para promover o ensino bilíngue. Depois me dei conta de que falta muitos recursos para serem excelentes na modalidade bilíngue (Participante 3).

Fonte: Elaborado pelas autoras a partir dos dados
Quadro 3 – Categoria: Educação bilíngue - empoderamento dos surdos

Verifica-se, no núcleo de sentido Escola, que no relato da Participante 3 há um percentual muito pequeno de surdos na modalidade bilíngue em Barcelona, apenas 9% dos surdos. Isso pode ser em decorrência da falta de políticas públicas que estimule a educação bilíngue para surdos apesar de haver 25 anos de início dessa proposta na Catalunha. Identifica-se que os profissionais de uma escola bilíngue são descritos como muito dedicados e que as famílias não são orientadas para a educação bilíngue, mas para uma abordagem mais oralista, conforme relata a Participante 3.

Uma proposta bilíngue aplicada no ensino de alunos surdos deve apresentar um caráter multicultural. Segundo Quadros e Karnopp (2004, p. 28) “uma proposta educacional, além de ser bilíngue, deve ser bicultural para permitir, o acesso rápido e natural da criança surda à comunidade ouvinte e para fazer com que ela se reconheça como parte de uma comunidade surda”.

Os alunos surdos inseridos em escola de alunos ouvintes têm experiências segregadoras, que impedem seu acesso às atividades da escola, pode se dizer que há uma exclusão constante. Os alunos surdos buscam meios para entender o que está acontecendo ao seu redor, todo o tempo, seja em sala de aula ou nos momentos livres e de descontração, como no pátio e na hora do recreio. Isso fica evidente no trecho do livro “Háblame a los ojos”, sobre a hora do recreio escolar:

As meninas conversam umas com as outras, compartilhando e conversando sobre suas coisas ... Eu fixo, no meio de diferentes vozes, na boca de uma delas. Eu pego algumas palavras. - ... minha avó ... depois ... eu falo e ... quero dizer ... é claro ... eu falei ... então ... a casa ...
Depois de um tempo, vejo que riem. Me pergunto o que tenho que fazer se não entendi o que estava explicando. Eu realmente quero saber do que estão rindo. Pergunto a colega ...
- Nada, é bobagem - me diz.
Então penso: "De que bobagem se pode falar? E se diz que isso é uma bobagem, por que as dizem e todas riem? Parece que se divertem muito. Quando digo bobagem, me chamam de idiota. Estou um pouco confusa: o que é uma bobagem? (CEDILLO VICENTE, 2004, p. 45, tradução nossa) 6.

Núcleo de sentido – Língua de Sinais
As crianças surdas não têm a experiência de ver surdos adultos conversando, dialogando entre si (Participante 2).
O problema mais grave que temos aqui é a etapa 0-3 anos, aí está o problema mas grave. Porque na etapa 0-3, não tem LS, está abolida a LS, não existe a LS, e é a etapa mais importante (Participante 1).
Os pais estão fazendo o curso com professores surdos também, esses cursos estão super bem, mas não são suficientes. Chega um momento em que os pais necessitam de mais, têm que fazer cursos com mais horas, porque o filho aprende e você fica pra atrás. Então, esse cursos mais longos são muito caros e não há auxílio, os cursos de LS deveriam ser gratuitos (Participante 1).
Incluir a LS e a modalidade bilíngue nos decretos dos programas pedagógicos da educação infantil, primária e secundária, claro isso é de 3 a 16 anos (mas o que também é muito importante), é considerar essa situação como emergência, a atenção precoce de 0 a 3 anos, centrar-se aí, e que essa oportunidade seja oferecida para todas as famílias dos surdos, em um contexto rico de LS a todas elas (Participante 3).

Fonte: Elaborado pelas autoras a partir dos dados
Quadro 4 – Categoria: Educação bilíngue - empoderamento dos surdos

Nesse núcleo de sentido, Língua de Sinais, há uma unanimidade em reconhecer e afirmar o papel preponderante da LS na constituição de uma pessoa surda, com destaque para o período optimal de aquisição de uma língua. É possível perceber que as participantes consideram que quando oportunizada a sua aquisição nesse período crítico (até 3 anos), a LS torna-se propulsora do desenvolvimento cognitivo e linguístico do surdo.

Pode-se destacar que a LS é essencial para o desenvolvimento da identidade de uma pessoa surda, com possibilidades de se relacionar de modo efetivo com a comunidade surda o que possibilita o conhecimento de mundo, ou seja, as vivências sociais, crenças, valores culturais, e consequentemente favorece a conexão com a sociedade na qual está inserido, conforme descreve Cedillo Vicente (2004):

- Te entendo muito bem. Você quer dizer que, para expressar uma ideia simples se necessitava muito tempo.
Sim, é assim. Quando entrei na escola, descobri que havia uma economia de tempo, porque todos já haviam concordado com os sinais de cada ideia ou representação. No mesmo momento, senti que recebia uma enxurrada de ideias toda vez que me explicavam algo. Minha cabeça não estava acostumada a assimilar tantos conceitos em tão pouco tempo. Estava fascinada com as diferentes formas de expressar ideias (CEDILLO VICENTE, 2004, p. 45, tradução nossa) 7.

Percebe-se que o não acesso a uma LS pode comprometer a autonomia, o empoderamento do surdo enquanto membro da sociedade a qual faz parte e, ainda, pode interferir na formação da identidade surda (BIZIO, 2014; CHAVEIRO, et al., 2014; QUADROS, et al., 2012).

Núcleo de sentido – Privação linguística
Tenho tido uma preocupação com o aumento da quantidade de surdos que chegam à escola com outros comprometimentos, por exemplo: Retardo de Aquisição da Linguagem (RAL), autismo e outras deficiências (Participante 2).
Tem crianças com graves dificuldades e a história é que chegam crianças para educação bilíngue que são “fracassos”( digo entre aspas): são “fracassos” do oralismo, crianças que simplesmente com a modalidade oral não têm desenvolvido como esperavam, eles chegam à Escola tarde, chegam com 7, 8, 9, 10 anos, chegam crianças muito maiores, com muitos problemas de comunicação, de aprendizagem claro, de tudo, tentar consertar isso é muito difícil (Participante 1).
E seguimos tendo crianças graves, graves de verdade, privados de uma língua, e isto és muito grave, porque tínhamos crianças que somente eram surdas e agora são surdos e têm outras deficiências, acrescentadas como consequência dessa privação linguística, temos crianças com traumas psicóticos, problemas de conduta, problemas de comunicação, problemas de auto estima, dificuldades muitos sérias de conhecimento (Participante 1).
Alunos que chegam muito tarde à LS e têm outras dificuldades acrescentadas, mostram algumas dificuldades cognitivas, seguramente fruto da surdez, não da surdez diretamente, mas da não aquisição da linguagem (Participante 3).

Fonte: Elaborado pelas autoras a partir dos dados
Quadro 5 – Categoria: Educação bilíngue - empoderamento dos surdos

Nesse núcleo de sentido, Privação linguística, destacamos nos depoimentos dos participantes que muitos surdos em Barcelona têm chegado tarde à escola e com comprometimentos relacionados a habilidades linguísticas, ou seja, a não aquisição plena de uma língua.

Com base na neurolinguística, sustentamos a argumentação de que a aquisição tardia da LS produz efeitos devastadores no desenvolvimento dos surdos; esses efeitos também foram percebidos pelos participantes desta pesquisa; as graves consequências atingem as diversas esferas que compõem um indivíduo, como as relações sociais e afetivas, a dimensão psicológica compreendendo sentimentos positivos e negativos, autoimagem e independência com capacidade para eleger com autonomia, podendo comprometer o desenvolvimento de linguagem e como consequência o surdo pode apresentar um quadro de Retardo de Aquisição da Linguagem (RAL), que quando diagnosticado nos surdos pode estar vinculado à ausência de uma língua que propicia o desenvolvimento cognitivo e linguístico. Desse modo, as pessoas envolvidas no contexto educacional dos surdos, tornam-se corresponsáveis em assegurar o contato com a LS, de modo que ela possa ser adquirida naturalmente (QUADROS et al., 2012).

Núcleo de sentido – Saúde e estimulação precoce
Na Catalunha existe uma vertente muito forte com relação à reabilitação oral do surdo; há políticas por parte do governo que estimulam e facilitam o acesso dos surdos aos dispositivos de amplificação auditiva, chegando ao ponto de referir que a LS pode ser prejudicial ao surdo (Participante 2)
Está no meio dos implantes cocleares um interesse econômico muito grand; atrás de cada implante coclear, e cada implante coclear tem uns 25 mil euros em média de financiamento, que não é pago pela família, mas, sem dúvida, cada vez que apresentam defeito, o seguro, o processador, as pilhas, uma série de gastos que cabem à família cobrir (Participante 1).
Aqui desde que se detecta a surdez com o scrining neonatal, agora é no primeiro minuto, no primeiro minuto a maioria sabe se os bebês são surdos, e são automaticamente encaminhados aos CREDAS; dizer que existe um círculo vicioso, que é muito difícil de sair, ainda mais se vende o implante coclear com panacéia, o milagre, e isso não é certo. Ainda hoje o milagre não existe, é uma ajuda protética que pode ser muito boa. Em muitos casos, funciona bastante bem e ajuda muito com a aquisição da língua oral, a aquisição da escrita, pode ajudar muito, mas não se tornam ouvintes, não ouvem como os ouvintes, não se desenvolvem como os ouvintes e realmente seguem tendo dificuldades para acesso a informação, para comunicar (Participante 1).
Para o surdo o acesso pleno a uma língua nunca será a LO, a situação que pode alcançar plenamente é a LS
(Participante 3).

Fonte: Elaborado pelas autoras a partir dos dados
Quadro 6 – Categoria: Saúde – reverberações da oralização no processo educativo

Segundo Quadros et al. (2012), a partir do objetivo de avaliar a aquisição da linguagem em crianças surdas com implante coclear (filhas de pais ouvintes e filhas de pais surdos) e crianças ouvintes (filhas de pais surdos), evidencia-se que as crianças surdas com IC, filhas de pais surdos, e, portanto, com contato pleno e irrestrito à LS, têm um desempenho similar ao de crianças ouvintes filhas de pais surdos. No entanto, as crianças surdas com IC, filhas de pais ouvintes, e com acesso limitado à LS, demostram uma performance inferior quando comparadas a outras crianças com acesso pleno à LS.

Assim, podemos inferir, com base nas falas das participantes deste estudo, que a criança surda pode se beneficiar do IC. E, inclusive, ele pode auxiliar no seu desempenho linguístico, social e educacional. No entanto, todas participantes reforçam a prioridade que deve ser dada ao uso da LS e seus depoimentos corroboram com o estudo de Quadros et al. (2012), cujos resultados mostraram que deve ser garantido às crianças surdas implantadas o acesso pleno à LS.

A análise dos resultados revela que a criança surda com implante coclear com acesso irrestrito à Libras apresenta desempenho muito próximo das crianças bilíngues bimodais ouvintes na Libras e no Português, resultado diferente das crianças surdas com implante coclear com acesso restrito à Libras, que apresentam desempenho inferior no Português e nos padrões fonológicos da Libras, sendo que mesmo com acesso restrito à Libras estas crianças conseguem atingir desempenho melhor na Libras. Com base nisso, o estudo realizado indica a importância de garantir às crianças surdas com implante coclear o acesso irrestrito à Libras (QUADROS et al., 2012, p. 185).

Núcleo de sentido – A força do oralismo
Aqui em Barcelona existem os CREDAS (Centro de Recursos Educativos para Deficientes Auditivos),... os CREDAS têm uma tendência oralista muito clara, muito, muito clara, e apesar de, aqui na Catalunha, termos a Lei da LSC, essa lei retrata que aqui na Catalunha tem duas modalidades educativas para os alunos surdos: a modalidade exclusivamente oral e a modalidade bilíngue. Apesar disso, os CREDAS continuam oferecendo, até o dia de hoje, às famílias, somente informações sobre a modalidade oral (Participante 1).
Estamos muito exaustos que nos discriminem continuamente, apesar de termos uma lei que nos respalde, apesar de havermos escolhidos a educação bilíngue e numa escola que tem essa modalidade, apesar disso continuamos sendo muito discriminados (Participante 1).
Há pouco conhecimento da LS, e, em nenhum dos CREDAS, há uma política de atenção precoce que inclua a LS. Política, quero dizer, não há uma medida que se uma família vem e diz quero língua oral mas também quero LS. Onde podemos proporcionar isso? Aqui no CREDA podemos contar com esse serviço? Seria normal, a administração teria que proporcionar as duas modalidades, entretanto, o CREDA, de momento, não oferece (Participante 3).
E o que eu percebo? É que essa etapa precoce, tão básica para as crianças, não tem sido levada em conta, quer dizer: para algumas famílias, os fonoaudiólogos dizem: espera um pouco mais, até os 7 anos, que já está a ponto de desenvolver a língua oral; espera um pouco mais que já verás... pode ficar tranquila... paciência... sobre tudo, muita paciência... isso é grave! (...) A orientação à família, no momento está nas mãos de pessoas que não conhecem a LS (Participante 3).

Fonte: Elaborado pelas autoras a partir dos dados
Quadro 7 – Categoria: Saúde – reverberações da oralização no processo educativo

Nesse núcleo de sentido, “A força do oralismo”, percebe-se que a concepção biomédica da surdez, cujo paradigma está centrado numa visão clínica da surdez, tem prevalência sobre a abordagem socioantropológica da surdez, na qual a perspectiva está no campo social e linguístico, na LS como meio de comunicação e interação entre surdos e ouvintes. Nos depoimentos desta pesquisa, está explícito que a LS não está sendo valorizada pelas instituições que atendem ao surdo, o que pode ocasionar uma barreira para a educação bilíngue não só em Barcelona, mas em qualquer lugar.

Defende-se que o ideal seria que, após o diagnóstico de surdez, as famílias tivessem uma orientação no sentido de assegurar ao surdo o contato com a LS o mais rápido possível, por ser ela a única língua que admite à pessoa surda acesso a todas as características linguísticas de uma língua. No relato das participantes desse estudo, está claro que não se está oportunizando às famílias de Barcelona o direito de conhecer a LS e o impacto da LS na vida do seu filho surdo. Finger e Quadros (2008) alegam que a LS é indispensável à inserção da criança surda no fluxo natural da linguagem, pelo fato de seu canal de comunicação ser acessível (vísuoespacial).

As relações sociais que a criança surda tem ao seu redor contribuem para adquirir a LS. Isto inclui suas relações com outras crianças surdas e adultos surdos e, principalmente, a relação entre os pais ouvintes e a criança surda deve ser uma relação tão sólida e comunicativa quanto a de pais e crianças ouvintes. Além disso, a criança surda num ambiente familiar, que utiliza também a LS, terá condições adequadas para se desenvolver e adquirir, assim, um recorte de mundo e se transformar em um ser crítico-reflexivo.

Núcleo de sentido – Família inclusiva
Cada surdo é um mundo e depende muito da família para que o surdo possa ter acesso a LS e para que o bilinguismo tenha sucesso (Participante 2).
Realmente se encontram crianças com muitas dificuldades e com famílias que têm sofrido muito, vindo do oralismo têm sofrido muito. Levar isso a frente é muito difícil, mesmo com recurso, mas se tivesse mais seria melhor, pois as necessidades são muito grandes (Participante 1).
As famílias são discriminadas de alguma maneira e são pressionadas para que façam o implante, sim ou sim. Estão implantando bebês com uma surdez severa, sem esperar o protocolo que agora há nos hospitais em Barcelona, apenas se testam os aparelhos auditivos, se dá pouco tempo de resposta, com o qual muitas crianças implantadas, não necessitaria de IC, tem muitos interesses econômicos, e por isso tudo gira ao redor da LO, e tudo está ligado: do hospital passa ao CREDA, do CREDA te implantam, do CREDA a escola de modalidade oral, e dai não sai mais, e se te queixas, …paciência… e que paciência! (Participante 1).

Fonte: Elaborado pelas autoras a partir dos dados
Quadro 8 – Categoria: Família – interface com a educação bilíngue

A grande maioria das crianças surdas nascem em famílias ouvintes, e praticamente não tem contato com a LS, identidade e cultura surda. É possível correlacionar esse fato à participante 1, expressa que o bom desempenho do surdo na educação bilíngue está relacionado à presença da família no processo educacional. No entanto, as participantes consideram que em Barcelona a família não tem recebido um suporte adequado quanto às possibilidades de comunicação e educação do seu filho surdo. As condições expressas nessa pesquisa apontam que o enfoque oralista tem prevalecido e, desse modo, as consequências da aquisição da LS pelo surdo fica prejudicado.

Assim, entendemos que, como as LS, existem línguas orais que são consideradas línguas minoritárias. No entanto, as LS têm duas características diferentes: enquanto as línguas orais minoritárias compartilham o mesmo espaço geográfico. A LS está espalhada, não tem um território, não tem um país, mas, nem por isso, deixam de estar no arcabouço das línguas minoritárias. A outra diferença se pauta na socialização dos valores culturais, sociais e linguísticos, visto que, geralmente, eles são transmitidos de pais para filhos, mesmo que o uso de algumas línguas minoritárias seja proibido pelo Estado, não há meios de impedir sua difusão no ambiente familiar. Os pais transmitem aos filhos sua língua, seus artefatos culturais e sua identidade; já em contraponto, os surdos, filhos de pais ouvintes, ficam à margem; geralmente não encontram um ambiente que propicie a sua inclusão comunicacional e, consequentemente, os valores socioculturais (TROVATO, 2013).

Considerações finais

A legislação espanhola no que ser refere ao uso da LS e da LO deixa explicito a necessidade de estimular e valorizar a LS. Ao mesmo tempo, coloca em patamar de igualdade e valorização a língua oral, conforme consta no título da Lei Espanhola: “Lei 27/2007, de 23 de outubro, que reconhece as línguas de sinais espanholas e regula os meios de apoio à comunicação oral de pessoas surdas, deficientes auditivas e pessoas surdocegas.” 8 (ESPANHA, 2007 p. 1).

Com base nos resultados dessa pesquisa, podemos inferir que o que está previsto na lei espanhola, no que se refere à estimulação da língua oral, está refletindo na educação dos surdos. Há uma valorização da língua oral com incentivos para os implantes cocleares e há pouco auxílio por parte do Governo para o fortalecimento da educação bilíngue para os surdos. Os dados mostram que há uma redução significativa dos surdos que optam pela educação bilíngue, o que tem instigado a associações de pais de surdos a reivindicarem o cumprimento integral da lei, uu seja, o uso e valorização das duas línguas de modo igualitário, e que isso aconteça também na escolarização dos surdos, com fortalecimento da educação bilíngue.

Assim, a educação bilíngue de surdos em Barcelona vive um momento de ressignificação, de luta e busca pela valorização da LS. Concomitante, não descartam os benefícios dos dispositivos de amplificação auditiva (como o IC) e têm plena consciência que o “implante coclear não é um milagre, não há milagres” (Participante 1).

No Brasil, também existe uma legislação que apoia os procedimentos para implante coclear, há uma determinação, uma portaria do Ministério da Saúde, n. 18 de 10 de junho de 2014 (BRASIL, 2014) para que o Sistema Único de Saúde (SUS) ofereça aos surdos o implante coclear. Mesmo que o incentivo por parte do Brasil seja menor em relação à Espanha, e ainda que o implante coclear seja visto como um estímulo à língua oral, excluir a LS de qualquer prática com os surdos gera um prejuízo ao seu desenvolvimento (FINGER; QUADROS, 2008).

Há um desejo crescente, identificado nos dados, de que a educação bilíngue para os surdos em Barcelona seja de excelência, que promova seu desenvolvimento educacional, linguístico, cognitivo e, principalmente, que os surdos tenham o direito ao acesso ao conhecimento em sua língua de forma natural; que a LS seja mais reconhecida e valorizada na educação dos surdos. Identificamos nos dados que as políticas governamentais de Barcelona têm induzido, na percepção dos participantes, muito mais para a LO e para o implante coclear do que para a educação bilíngue. O implante coclear é visto pelos participantes com reconhecimento, pela sua importância; lamentam, no entanto, que a LS não esteja com a centralidade necessária de que o surdo necessita dentro das práticas educacionais bilíngues.

Esse estudo alcança seu objetivo de descrever o processo educacional de surdos numa perspectiva bilíngue, por meio da visão advinda da família e do contexto educacional. Com o foco na realidade da educação bilíngue para os surdos em Barcelona, permita-nos inferir que há o surgimento de um novo perfil sociocultural da pessoa surda, poderíamos dizer que seria um surdo bilíngue implantado. Com esse perfil de alunado surdo, surgem novas demandas, atividades e situações transformadoras. Concomitante, há que se encontrar um modo de interagir entre os diferentes poderes que se estabelecem nesse cenário, diríamos: o poder biomédico, o poder estatal, o poder educacional e o poder familiar, todos independentes, mas ao mesmo tempo como trama, uma rede, que deve se articular para que o surdo tenha acesso pleno ao conhecimento, à educação bilíngue.

Notas

4 Trecho original em Espanhol: la lengua de signos catalana como sistema lingüístico propio de las personas sordas y sordociegas signantes de Cataluña.
5 Trecho original em Espanhol: Modalidad educativa bilingüe: el proyecto educativo en que coexisten la lengua de signos catalana, como materia de estudio y lengua vehicular en la comunicación y el acceso al currículo escolar, y las lenguas orales y escritas oficiales, que también son objeto de aprendizaje.
6 Trecho original em Espanhol:
Las niñas hablan entre ellas, compartiendo y charlando de sus cosas… Me fijo, en medio de distintas voces, en la boca de una de ellas. Capto algunas palabras. - … mi abuela… después… hablo yo y… o sea… claro… dije… entonces… la casa… Al cabo de un rato, veo que ríem. Me pregunto qué tengo que hacer si no he entendido lo que explicaba. Tengo muchas ganas de saber de qué se están riendo. Le pregunto a la compañera…
- Nada, es una tontería – me dice.
Entonces pienso: “¿De qué tonterías se puede hablar? Y se dice que es una tontería, ¿por qué las dicen y ríen todas? Parece que se lo pasan muy bien. Cuando yo digo tonterías, me dicen tonta. Estoy un poco confundida: ¿qué es una tontería? (CEDILLO VICENTE, 2004, p. 4).
7 Trecho em Espanhol:
—Te entiendo muy bien. Quieres decir que para expresar una simple idea se requería mucho tiempo.

Sí, así es. Cuando entré en la escuela, descubrí que había una economía de tiempo, porque todos habían pactado ya los signos para cada idea o representación. En ese mismo momento, yo sentía que recibía como un torrente de ideas cada vez que me explicaban algo. Mi cabeza no estaba acostumbrada a asimilar tal cantidad de conceptos en tan poco tiempo. Estaba fascinada con las diversas maneras de expresar las ideas (CEDILLO VICENTE, 2004, p. 45).

8 Trecho em Espanhol: “Ley 27/2007, de 23 de octubre, por la que se reconocen las lenguas de signos españolas y se regulan los medios de apoyo a la comunicación oral de las personas sordas, con discapacidad auditiva y sordociegas”. (ESPANHA, 2007 p. 1).

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