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Personagens Virtuais no Ensino da Língua Gestual Portuguesa
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Publicado em 2003
Universidade do Minho
Leonel Domingues Deusdado
António Ramires Fernandes
  Artigo disponível em versão PDF para utilizadores registados
Resumo

The Portuguese Sign Language (LGP) faces a low diffusion level, among the deaf as well as the hearing communities. The communication of a deaf person, to be effective, requires the knowledge of LGP, not only on the speaker’s side, but also from the listener’s. It is also essential that both speak the same sign language. Due to the shortage of information, or lack of availability of the language, it is common to see people of neighbouring regions, using different gestures for the same words. It is in this babylon that, in linguistic terms, deaf people live nowadays. As communication is an essential factor to learning, it is fundamental to explore all the possible ways of taking the LGP to a large number of people. This paper focuses on the use of the new technologies in the diffusion and teaching of the sign language. Even thought there is an agreement on the need of human intervention in the teaching of a sign language, it is also true that there is no dispute in relation to the added value that the new technologies represent as support material in the teaching. We give special emphasis on the technologies that use images and/or models based in three-dimensional graphics to create virtual signers.

1. Introdução

Calcula-se que existam cerca de 100 a 150 mil pessoas com problemas auditivos em Portugal. Destas, cerca de 15 mil pessoas, têm na Língua Gestual Portuguesa (LGP), a sua língua primeira, o seu modo de expressão e o seu principal traço de identidade pessoal e de grupo. A aprendizagem da língua gestual é por isso um instrumento indispensável para a verdadeira integração das pessoas surdas para que usufruam da sua plena cidadania. As crianças e os jovens surdos são talvez os principais afectados por não estar ainda garantido o ensino e o acesso generalizado da LGP e a sua utilização nas mais diversas situações na sociedade.

Nos últimos quinze anos a comunidade surda assistiu com expectativa a esta saga prodigiosa da evolução das tecnologias de informação. Para eles aquilo que encontravam de mais fascinante nas tecnologias de informação é de a comunicação com o computador se poder processar no modo ideal para uma pessoa surda: através da comunicação visual. O que é que aconteceu realmente ao longo destes últimos anos? Os meios audiovisuais já estão a ser efectivamente usados na educação e formação das pessoas surdas? Já existem conteúdos pedagógicos em CD-ROM´s, sites www, cassetes vídeo, ou noutro suporte audiovisual destinados ao ensino da LGP de modo a alargar as possibilidades de comunicação, aprendizagem, integração e socialização de todas as pessoas surdas? Os meios de comunicação mais avançados como o ensino à distância, Internet de banda larga, realidade virtual, modelação/animação com imagens 3D, e mesmo futuramente os novos serviços de telecomunicações – UMTS, estando ao dispor de todos, poucas vezes são devidamente aproveitados para diminuir a barreira linguistica ainda existente. Sendo assim, a possibilidade do uso das novas tecnologias para a supressão ou redução de barreiras linguísticas e sociais, que ainda vigoram entre uma sociedade dita “normal” e uma sociedade com dificuldades auditivas com uma língua própria, permanece ainda nos nossos dias como um desafio.

A pessoa surda necessita para a sua formação de um meio de comunicação eficaz. Para isso, podem contribuir as aplicações informáticas específicas quando as aplicações convencionais, com ou sem adaptações, resultem insuficientes. De outro ponto de vista, as tecnologias de informação oferecem possibilidades de desenvolver certas aptidões que se encontram geralmente minimizadas em alunos com surdez. É esta a realidade que se impõe com toda a evidência. Ou seja, com a ausência de estratégia que se tem seguido até hoje nunca se conseguirá uma eficiente formação na comunicação em língua gestual[1]. Os novos desenvolvimentos em áreas como a computação gráfica, bases de dados distribuídas, redes de computadores, paralelamente ao desenvolvimento galopante do hardware renovam as esperanças de obter um sistema global de aplicações integradas capaz de se adaptar e preencher carências de utilizadores com necessidades especiais sob a forma de ajuda linguística ou de comunicação num mundo dominado pelas maiorias. 

Pretende assim este artigo apresentar algumas soluções já desenvolvidas, e em desenvolvimento, de sistemas de apoio à língua gestual. Em particular será detalhado um projecto para o ensino da língua gestual Portuguesa destinado não só à comunidade surda mas sim a todos os que com ela pretendam interagir. Este tipo de aplicações não se poderá resumir à comunidade surda, o objectivo é também dar a conhecer esta língua aos ouvintes, pois para uma comunicação entre surdos e não surdos é necessário um esforço também dos segundos.

Não se pretende assim, métodos de visualização que compitam com pessoas reais na produção de língua gestual, já que uma qualidade tal, só muito dificilmente poderá ser alcançada.

Este artigo está organizado da seguinte forma. A Secção 2 apresenta trabalhos relacionados no desenvolvimento de aplicações específicas direccionadas para pessoas com dificuldades auditivas no campo das interfaces, ensino e aperfeiçoamento de língua gestual. A secção 3 descreve o funcionamento “mecânico” do tronco superior do corpo humano com evidência para as mãos e a forma de animar os futuros movimentos tendo em conta as restrições de movimentos humanos. A Secção 4 apresenta a descrição do trabalho desenvolvido na construção de um construtor de movimentos utilizando personagens 3D virtuais para ajudar o ensino e aperfeiçoamento da LGP. A Secção 5 apresenta uma análise a um pequeno teste de usabilidade realizado a utilizadores surdos e ouvintes. Finalmente, na secção 6 apresentam-se conclusões da integração das novas tecnologias no apoio à LGP e um possível trabalho futuro.

2. Trabalho Relacionado

Os anos mais recentes foram testemunha de um interesse crescente no campo da interacção homem-máquina envolvendo linguagem falada acompanhada de gestos e expressões faciais. Os projectos resumidos aqui apresentados recorrem na sua maioria a personagens virtuais 3D para efectuar uma comunicação efectiva, onde gestos e expressões faciais são utilizados para transmitir uma mensagem, por vezes complementar à língua falada, por outras como meio principal de diálogo.

Cassel, et al [2] introduziu um sistema onde agentes virtuais pudessem comunicar automaticamente com outros agentes através de canais sincronizados que representam a fala, gestos e expressões faciais. Os agentes têm o seu próprio “conhecimento do mundo” e actuam de acordo com esse conhecimento. O sistema simula um comportamento real da comunicação humana. A geração de gestos consiste basicamente em símbolos com pouco ou nenhum movimento dos dedos, mas em qualquer dos casos já o bastante para anotar evoluções neste campo.

Geitz, et al [3] descreve a colocação em prática de uma interface acessível via Web para gestos com base em ASL 1. O trabalho teve inicio com o modelo tridimensional simples da mão e foram adicionadas especificações para todos os graus de liberdade possibilitar a construção de gestos estáticos. Na interface, os graus de liberdade de uma mão podem ser alterados pela manipulação de um painel de controlo. Tanto o controlo entre os dedos e pulso, como a localização e orientação do modelo da mão são passíveis de ajustamento individual. O Web site proporciona um protótipo de um conceito de professor virtual. Aqui os utilizadores poderão introduzir uma cadeia de caracteres ou números e ver a sequência de animação correspondente em ASL gerada dinamicamente em VRML.

Godenschweger e Wagener [4] consideram que um dos objectivos desde há muito para ajudar as pessoas surdas é o desenvolvimento de sistemas automáticos para produzir língua gestual. Foram assim propostos algoritmos para a geração de expressões de língua gestual através de gráficos de linhas. É usada a vantagem da natureza abstracta das linhas, onde não é necessária uma apresentação muito detalhada. Nos gráficos de linhas, somente são visualizados os contornos e algumas outras linhas onde é possível focar certas áreas usando diferentes estilos de linhas [5]. Neste caso uma apresentação através desta técnica leva-nos longe na simplicidade, modelos de menor detalhe mas com uma imagem estética fácil de entender pelos utilizadores.

Um protótipo de hardware/software para gravação, edição e visualização de gestos foi desenvolvido no departamento de Media Technology and Design da Universidade Politécnica de Upper na Áustria [6] com base em modelos em três dimensões e animação por computador. Permite armazenar gestos usando captura de movimentos com ajuda de hardware específico, seguindo a posição e movimentos das mãos, braços e do corpo superior, ocorrendo a visualização já durante a gravação dos movimentos. Os dados dos movimentos obtidos são aplicados ao software de animações 3D onde aí poderão também ser editados e corrigidos, após isso, os dados da animação são tratados por um motor 3D na aplicação MUDRA. As características interactivas são proporcionadas ao utilizador do programa através de várias opções de câmaras e ângulos de visualização 3D.

O projecto ViSiCAST [7], subsidiado pela União Europeia tinha o objectivo de anunciar previsões meteorológicas a partir de um humano virtual (avatar), guardando as traduções semi-automáticamente a partir de texto para língua gestual. Com a ajuda do computador, palavras escritas são analisadas e transpostas numa sequência de gestos. Posteriormente, estes gestos são exibidos, usando animação por computador a partir de um humanóide. As áreas de foco da aplicação seriam a televisão, www/multimédia e as chamadas transacções “cara a cara” [8,9].

3. Biomecânica - Mãos e Tronco Superior

O esqueleto de uma mão comporta os ossos do punho (carpo), do metacarpo e os ossos dos dedos. As articulações em cada mão poderão ser identificadas como indica a Figura 1 pelas articulações situadas na base do pulso entre o carpo e metacarpo, as articulações de cada dedo sobre o seu metacarpo e a articulações entre falanges.

Figura 1. Esqueleto e articulações da mão (Imagem original em: “Conception et ajustment dún modèle 3D articulé de la main”, H. Ouhaddi et P. Horain)

A mão é um objecto articulado com 28 graus de liberdade. Seis deles são definidos ao nível dos punhos: 3 rotações e 3 translações. Vinte e dois são associados às diferentes articulações dos dedos. Dois graus de liberdade (abdução/adução e flexão/extensão) para as articulações metacarpo-falanges (Figura 2), um outro (flexão/extensão) ao nível de cada articulação inter-falange. A articulação carpo-metacarpo no pulso possui 3 graus de liberdade: abdução/adução, flexão/extensão e uma pseudo rotação entre os ossos do Carpo e a base do metacarpo do pulso, devido ao relaxamento ou não dos ligamentos.

Figura 2. Movimentos ao nível das articulações Metacarpo-Falanges (Imagem original em: “Conception et ajustment dún modèle 3D articulé de la main”, H. Ouhaddi et P. Horain)

A biomecânica do tronco superior humano é muito complexa, a representação dos modelos 3D propostos para a aprendizagem de LGP recorrem como é lógico unicamente a uma aproximação dos movimentos humanos. Numa animação por computador, uma figura articulada é frequentemente modelada por um conjunto de segmentos rígidos 2 conectados por junções 3. Abstractamente, uma junção é um ponto de contracção na relação geométrica entre dois segmentos adjacentes (Figura 3).

Figura 3. Figura articulada por Joints e Bones

Esta relação é expressa por um número de parâmetros chamados de ângulos de junção. Assim sendo, os segmentos são conectados para a formação de uma estrutura em árvore, resultando uma colecção de ângulos de junção de todas as junções, correspondendo exactamente à configuração de uma figura. Esta correspondência fornece uma imediata representação pelo computador das configurações da figura articulada dados os conjuntos de ângulos de junção, esta configuração de correspondências é directa e linear para o computador, no entanto, o problema de encontrar o conjunto de ângulos de junção que correspondam a uma dada configuração (Cinemática Inversa 4) já não é tão trivial. A cinemática inversa apresenta várias aplicações para figuras articuladas:

  • Manipulação Interactiva
  • Controlo da animação
  • Acessibilidade no ambiente espacial
  • Evitar colisões

Assim, podemos dizer que a cinemática é o processo de cálculo da posição no espaço dos extremos de uma estrutura conectada dados os ângulos de todas a junções. Este processo é relativamente fácil e para ele há uma só solução. A cinemática inversa pretende realizar o processo contrário: dados os pontos finais de uma estrutura, determinar os ângulos que estarão associados a estas junções para um posterior arquivo dos pontos finais. Note-se que através da cinemática inversa, a solução não é necessariamente única. Inclusive é possível obter soluções impossíveis de realizar para um ser humano [10].

Por forma a garantir a validade da solução obtida através de cinemática inversa é necessário impor restrições ao movimento na estrutura (esqueleto) que visem representar movimentos semelhantes aos realizados por humanos, principalmente ao nível da rotação nos ângulos de junção das articulações. Deverão assim, ser especificados limites angulares sobre cada um dos eixos de cada ponto de junção, de forma a impedir movimentos que humanamente seriam impossíveis. Ao conjunto de articulações procurou dar-se-lhes expressões de uma forma simples, ordenada e natural, de modo a que quando houvesse interacção do utilizador com os modelos, os movimentos se assemelhassem com o maior rigor possível, aos movimentos humanos. Procurou-se assim averiguar como o movimento de um corpo se repercute sobre os corpos a ele ligados, por outro lado investigou-se a expressividade em termos de modelação gráfica de objectos com níveis de detalhe elevado.

Figura 4. Modelo movimentando a mão para junto do objectivo, utilizando a cinemática inversa, com imposição dos constrangimentos dos ângulos de junção do ombro e cotovelo. (Imagem original em: “Specialised Constraints for an Inverse Kinematics Animation System Applied to Artuculates Figures”, N. Madhavapeddy and S. Ferguson)

4. A Aplicação — Construtor de Movimentos para Língua Gestual

Foi desenvolvida a construção de uma interface 3D que permite aos utilizadores, definir novas posições e associar a estas uma letra, palavra ou frase de forma a memorizarem os gestos construídos. É proposta uma página Web interactiva com um modelo completo 3D de um humanóide, e mãos adicionais (direita e esquerda). Assim sendo, o utilizador poderá compor gestos com a ajuda de manipuladores tridimensionais, rotações e translações dos modelos, que após a sua composição serão associados a palavras, letras ou números em língua gestual, para numa fase futura, serem armazenados numa base de dados.

Fases do desenvolvimento:

  1. Procura, construção e simplificação dos modelos
  2. Escolha da tecnologia
  3. Definição das articulações e organização numa estrutura hierárquica
  4. Definição e restrição dos movimentos nos pontos articulados
  5. Especificação e implementação da Interface

4.1. Procura, construção e simplificação dos modelos

Para a componente prática desta artigo, e no caso específico do construtor de movimentos de língua gestual, havia intenção de ir um pouco mais além na qualidade dos modelos normalmente apresentados. Deveriam parecer-se mais com a realidade, principalmente as mãos teriam de ser parecidas às humanas tanto na forma como nas articulações, sabendo desde o início que condições como o número de polígonos, definição de texturas e cores deveriam ser alvo de atenção visto que os modelos resultantes não deveriam ser “pesados” para evitar desconforto na altura da sua interacção e consequente manipulação. Foram assim, retirados os modelos para as mãos (direita e esquerda) a partir de um modelo do Poser [11] de corpo inteiro (Figura 5) com um número de polígonos não excessivo, mas sem comprometer a qualidade.

Figura 5. Modelo completo de onde foram retiradas as duas mãos

Desta separação resultaram dois objectos que representariam as mãos com uma definição detalhada já que contavam com um número de polígonos razoável (1449 polígonos), haveria no entanto que proceder posteriormente à sua simplificação de forma a facilitar o acesso via Internet, e tornar mais leve a aplicação onde se incluiriam (Figura 6).

Figura 6. Modelo da mão antes (1449 polígonos) e após (197 polígonos) a simplificação

O modelo de corpo inteiro que se achou mais apropriado usar foi encontrado na Web. É uma representação de uma figura humana do sexo masculino, geometricamente simples, e por consequência de rápida transmissão na internet. Para este modelo não seria necessário grande definição, já que unicamente necessitaríamos de mover os braços e cabeça de forma a expressar a posição do tronco superior do humanóide aquando da construção dos gestos. A interacção com as mãos seria realizada nos modelos encontrados acima, que na interface aparecerão aos lados do humanóide, tudo num mesmo écran. O modelo de corpo inteiro já combina uma estrutura de polígonos e um mapa ou imagem da textura aplicada sobre o anterior, de forma a reduzir assim a complexidade geométrica do modelo como se comprova na abaixo.

Figura 7. O modelo 3D utilizado

4.2. Escolha da Tecnologia

O que se pretendia criar, era então, uma aplicação 3D interactiva, leve quanto baste, capaz de ser implementada para a Web e de fácil manipulação capaz de construir gestos correspondentes a letras, números ou palavras em língua gestual. Aplicação esta, que contaria com os três modelos referidos anteriormente, com manipuladores directos sobre estes objectos de forma a criar movimentos que imitem os da vida real. Estes objectos possuiriam também capacidade de rotação sobre si, de forma a alterar o ângulo de visão e proporcionar uma manipulação e especificação eficiente. Havia então que escolher a tecnologia capaz de implementar este tipo de aplicação. Sabendo das mudanças contínuas no mundo dos gráficos 3D, foram assim, feitas pesquisas a aplicações Web3D. Web3D é um termo genérico, que descreve o display de uma tecnologia de computação gráfica em sites Web. As tecnologias Web3D remontam do já antigo VRML (Virtual Reality Modeling Language ) até às mais comuns usadas nos dias de hoje para quem pretenda ter Web interactiva 3D com alto nível de realismo e rapidez de interacção. Estamos a falar de tecnologias como Pulse3D, Anfy3D, Shockwave 3D, RealActor entre outras. A escolha recaiu na aplicação Pulse3D [12], que na altura se mostrou eficiente para o objectivo pretendido. A tecnologia Pulse3D combina um conjunto de técnicas como: authoring, playback, server-side, file format, e scripting, o que torna possível dar qualidade às vistas, conteúdo interactivo, velocidade e aspecto visual em animações, de forma a se posicionar no topo dos formatos 3D para a Web.

4.3. Definição das articulações e organização numa estrutura hierárquica

Os modelos do corpo e mão foram submetidos a divisões de estrutura no Pulse3D de forma a animar interactivamente os respectivos modelos na Web. No cas o das mãos (Figura 8) estas subdivisões deram origem a 19 pontos de transformação mas só 12 deles foram activados para a articulação das mãos, destes 12 pontos articulados 7 deles estão aptos unicamente para extensões e flexões e os 5 restantes acresce também as possibilidades de adução e abdução, o que no total representa 17 graus de liberdade para este modelo. Todos os pontos de articulação activos, são limitados por valores máximos e mínimos de rotação de forma a não gerar movimentos ou deslocações humanamente impossíveis.

Figura 8. Pontos de possível articulação do modelo de corpo inteiro e mãos

4.4. Definição e restrição dos movimentos nos pontos articulados

A activação dos pontos de articulação passaria por definir para cada um destes, valores de rotação máxima e mínima de forma a limitar os movimentos. A Figura 9 mostra-nos a restrição destes valores para dois pontos de junção com diferentes graus de liberdade. Para movimentos no ponto articulado do indicador “ind 1” foram definidos dois graus de liberdade “abdução/adução e extensão/flexão”, com valores de rotação mínimos de –10 e –22 respectivamente até valores máximos de 30 e 50, isto nos eixos “[0]” que corresponde ao “x” para a abdução/adução, e no eixo “[1]” que corresponde ao “y” para a extensão/flexão. Para o ponto de junção “ind2” foi unicamente possibilitado um grau de liberdade “extensão/flexão”, com valores de rotação entre 0 e 90, e utilizado unicamente o eixo “y” para futuros movimentos.

Figura 9. Restrições de movimentos nos pontos articulados

4.5. Especificação e implementação da Interface

A animação não é a arte do “desenho do movimento” mas a arte do “movimento que é desenhado”. O que acontece entre cada frame é mais importante do que existe em cada frame. A animação é “arte gráfica que ocorre no tempo” [13]. As aplicações gráficas dinâmicas têm de ser capazes de responder a eventos assíncronos de input independentemente quando este acontecem, assim, os desenhadores terão que desenvolver os seus programas com pequenos conhecimentos sobre quando e em que ordem estes eventos ocorrem. Por conseguinte, a qualquer momento durante a execução de uma aplicação dinâmica o estado geral terá de ser mantido explicitamente numa estrutura de dados global. Após algumas experiências com vários tipos de controlos ou manipuladores (directos e indirectos) para interagir com o utilizador de forma a permitir modelar as diferentes posições e combinações de gestos nos três modelos à disposição, sobressaiu o manipulador tridimensional (do género GLEEM [14]) pela forma directa e natural como interage com o modelo ou articulação associada. Estes manipuladores não são mais do que esferas colocadas junto do conjunto a efectuar rotações nas várias direcções e associados com o centro de referência da articulação ou conjunto de articulações a serem manipulados, o que permite um controlo fácil, preciso e principalmente intuitivo dos parâmetros do objecto ou conjunto de objectos a serem manipulados. Adicionalmente, e aqui ao contrário do manipulador GLEEM, a mudança de eixos coordenados é feita através de três controladores indirectos ou seja um botão para cada um dos eixos X Y e Z. Nos modelos das mãos temos 5 esferas de diferentes cores, cada uma associada a um dedo que o controla directamente em todos os seus graus de liberdade definidos, existe ainda neste modelo uma sexta esfera que controla as movimentações do pulso. No modelo de corpo inteiro temos 3 esferas associadas aos braços e cabeça de modo a poder construir posições específicas globais do tronco superior associadas aos respectivos gestos. Cada um dos modelos tem possibilidade também de rodar através de interacção directa do rato sobre o modelo, no caso das mãos e como já foi dito atrás, o tipo de rotação nos diferentes eixos poderá ser alterado através dos botões X, Y e Z. Existem ainda dois botões para cada um dos modelos (ON e OFF) que activam e desactivam o movimento e a visibilidade de todos os controladores directos 3D.

Figura 10. Interface do Construtor 3D

5. Testes de Usabilidade

Foi elaborado e proposto um inquérito à Associação de Pais para a Educação de Crianças Deficientes Auditivas (APECDA) – Mazagão- Aveleda- Braga entre as datas de Novembro de 2001 e Janeiro de 2002, depois de apresentada e testada a aplicação, obtiveram-se respostas num total de 14 inquéritos. Este, foi composto por 24 perguntas. Achou-se por bem, dividir e concluir os resultados a partir de uma análise comparativa entre duas secções: as respostas dos inquiridos ouvintes e as respostas dos inquiridos surdos, que totalizam 9 e 5 respectivamente.

Da análise das respostas e numa vista geral podem-se retirar as seguintes deduções:

  • A maioria dos inquiridos acha necessário e estão de acordo numa utilização mais alargada da Informática/Internet no ensino e aprendizagem de língua gestual Portuguesa.
  • Existe falta no mercado de aplicações informáticas que de alguma forma apoiem a língua gestual Portuguesa, a maior parte dos inquiridos desconhece mesmo, qualquer aplicação informática de apoio a esta língua.
  • Aprender, com o que se tem hoje, a comunicar fluidamente em língua gestual Portuguesa é um processo por muitos considerado aliciante mas moroso, podendo demorar até, mais de dois anos para se conseguir esse objectivo.
  • A aplicação testada revelou ser no seu conjunto um pouco difícil de utilizar, principalmente devido aos inquiridos e utilizadores em geral não estarem habituados a utilizar ferramentas 3D.
  • Os inquiridos sentiram-se motivados com a aplicação, mas ressalvaram o facto de quando possível preferirem visualizar gestos por imagens reais.
  • Consideram útil e viável a utilização do Construtor3D para o propósito que foi construído, ou seja, a memorização e aperfeiçoamento dos gestos respectivamente.
  • Acrescentam ainda, que a aplicação ajuda a normalizar a língua gestual de forma a evitar o aparecimento de vários gestos para a mesma palavra.
  • Um Gestuário 2D na Internet e consequentes vídeos são importantes, mas não suficientes no apoio à aprendizagem de língua gestual Portuguesa.
  • 86% dos inquiridos consideram útil dar continuidade ao trabalho até aqui desenvolvido.
  • De uma forma geral e principalmente do lado dos inquiridos surdos afirmam a vontade de continuar a utilizar esta ferramenta futuramente.

Assim, e paralelamente à utilização de personagens 3D virtuais, seria benéfico também criar outros meios alternativos de apoio a instituições direccionadas ao ensino de língua gestual Portuguesa, tal como meios de comunicações mais alargados e eficientes passando pela criação de sites Web interligados capazes de fomentar o gosto e alargar conhecimentos e informação neste tipo de linguagem.

6. Conclusões e Trabalho Futuro

Cada vez mais, intérpretes de língua gestual, estão ao serviço de construtores de aplicações gráficas de apoio à língua gestual, com o objectivo de transmitir os movimentos gestuais a aplicações que intentarão ajudar os anteriores em propósitos educacionais de língua gestual. Aplicações gráficas estas, por norma constituídas com base em humanóides 3D, ou parte deles, capazes de documentar língua gestual na World-Wide-Web. Este desenvolvimento poderá marcar um grande impacto no campo dos “livros de ensino de língua gestual”.

As questões de acessibilidade na utilização de interfaces nos meios informáticos, por parte de pessoas com certas necessidades especiais, têm vindo a tomar relevância especial de algum tempo a esta parte, com a formação de uma opinião pública cada vez mais consciente do tipo de problemas associados a esta problemática. A comunicação com pessoas com deficiências auditivas pode ser melhorada, oferecendo a uma vasta audiência a oportunidade de aprender língua gestual a uma escala mais alargada. A comunidade linguistica em língua gestual Portuguesa necessita de ser estendida, por forma a minimizar a exclusão social de alguns cidadãos, e para isso, terá de haver investimento em apoio tecnológico para ensinar o português escrito aos surdos e língua gestual Portuguesa a surdos e também aos ouvintes.

A componente prática desta trabalho passou pelo desenho, construção e implementação de um sistema de ajuda ao ensino de língua gestual Portuguesa com base numa aplicação gráfica tridimensional composta de “ferramentas” diversas, por forma a se enquadrar a um nível mais abrangente no propósito educacional de língua gestual Portuguesa a todos os sectores etários e linguísticos.

Este sistema é proposto via Internet nos endereços: http://www.ipb.pt/~leodeus/LGP ou http://sim.di.uminho.pt/mestrados/deusdado.

É possível estabelecer algum trabalho futuro baseado nas conclusões retiradas e nos problemas debatidos. Em primeiro lugar, melhorar a interface da aplicação ao nível do construtor de movimentos, que se revelou ser algo difícil de utilizar por parte dos inquiridos. Possibilidade de guardar os movimentos criados no Construtor3D, utilizando um motor de base de dados, permitindo assim implementar em seguida, um tradutor em tempo real de texto escrito para língua gestual Portuguesa com base nos movimentos guardados. A separação entre a componente visual (modelo) e a estrutura dinâmica (biomecânica) dos objectos em causa, apresenta-se como um dos objectivos futuros, de modo a poder ter vários modelos (interfaces) para diferentes utilizadores, ganhando assim um leque muito mais alargado de interesse ao nível visual sem aumentar consideravelmente a aplicação e não perdendo qualidades de interacção e movimentação em tempo real.

Notas

1 American Sign Language
2 Do inglês Bones
3 Do inglês Joints
4 Do inglês Inverse Kinematics

Bibliografia

[1] – Em conversa com o Director da Associação de País para a Educação de Crianças Deficientes Auditivas (APECDA), Braga, Novembro 2001.

[2] – Justine Cassell, Catherine Pelachaud, Normand Badler, Mark Steedman, Brett Achorn, Tripp Becker, Brett Douville, Scott Prevost, Matthew Stone, (1994). “Animated Conversation: Rule-based Generation of Facial Expression, Gesture & Spoken Intonation for Multiple Conversational Agents”, Proceedings of SIGGRAPH 94 In Computer Graphics Proceedings, Annual Conference Series, ACM SIGGRAPH, pp. 413-420.

[3] – Geitz, S., Hansen, T. and Maher, (1996). S. Computer generated 3-Dimensional models of manual alphabet handshapes for the World Wide Web, in Proceedings of ASSETS '96 (Vancouver, Canada) ,ACM Press, 27-31.

[4] – Frank Godenschweger, Thomas Strothotte and Huber Wagener, (1997).”Rendering Gestures as Line Drawings”, Gesture and Sign-Language Based Communication in Human-Computer Interaction, Springer.

[5] – Stefan Schlechtweg and Andreas Raab, (1997). “Rendering Line Drawings For Illustrative Purposes”, In Thomas Strothotte and Hubert Wagener (eds), Abstraction in Interactive Computational Visualization: Exploring Complex Information Spaces, Springer.

[6] – “Multimédia and 3D for Deaf People”, ver em http://www.fhshagenberg.ac.at/mtd/projekte/FFF/3dSign/english.html, (Consultado na Internet em Outubro 2001).

[7] – Verlinder, M., Tijsseling, C., Frowein, H, (2000) “A Signing Avatar on the www”.

[8] – Schulmeister R.:ViSiCAST (2000), Virtual Signing, Capture, Animation, Storage and Transmition.

[9] – Bangham, J. A., Cox, S.J., Elliott, R., Glauert, J.R.W, Marshall, I., Rankov, S., Wells, M (2000): An Overview of ViSiCAST. Presented at IEEE Seminar on “Speech and language processing for disable and elderly people” London.

[10] – Naganand Madhavapeddy and Stuart Ferguson, (1998) “ Specialised Constraints for an Inverse Kinematics Animation System Applied to Artuculates Figures”, The Quee´s University of Belfast, Ireland.

[11] – Poser. Software de criação e animação 3D a partir de “actores” e ferramentas de desenho 3D, Metracreations – Curious Labs. Disponível em http://www.curiouslabs.com. (Consultado na Internet em Fevereiro de 2003)

[12] – Pulse3D. Software de criação e animação 3D para a Web, Pulse- Bringing life to the Internet. Disponível em http://www.pulse3D.com, (Consultado na Internet em Fevereiro de 2002)

[13] – Martin, Private Comunication. Appears in Baecker, (1969) “Picture-Driven Animation.” Procedings of the Spring Joint Computer Conference. (pp. 273-288)

[14] – GLEEM. OpenGL Extremely Easy-to-use Manipulators. Disponível em http://www.media.mit.edu/~kbrussel/gleem/, (Consultado na Internet em Setembro. 2000)

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