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Marianne Rossi Stumpf
Marianne Rossi Stumpf
Doutora de Informática na Educação
Língua de sinais: escrita dos surdos na Internet
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Publicado em 2000
V Congresso Iberoamericano de Informática Educativa, Viña del Mar, Chile
Marianne Rossi Stumpf
Resumo

Até hoje no Brasil os surdos, usuários da língua brasileira de sinais não tem como escrever em sua própria língua. Isto quer dizer que para escrever usam o português escrito, sua segunda língua. Nesta língua encontram grandes dificuldades de expressão. A produção escrita dos surdos é quase inexistente, limita-se a comunicações rudimentares feitas com dificuldade. Na leitura , mesmo após muitos anos de escolaridade, a compreensão é pequena. Á partir de um trabalho de pesquisa e da construção de um dicionário de escrita de sinais da LIBRAS (Língua de sinais do Brasil) construído com base no sistema para língua escrita de sinais americana denominado Sign Writing comecei a trabalhar com os alunos surdos da Escola Especial Concórdia- ULBRA a escrita da língua brasileira de sinais. Desenvolver um ambiente para o ensino de escrita da língua brasileira de sinais brasileira que permita às pessoas ouvintes ou surdas aprender através do computador a escrita da mesma possibilitando assim, além da aprendizagem, a comunicação pela Internet entre pessoas surdas e ouvintes usuárias da LIBRAS foi o objetivo proposto para a implementação de um curso com estas características. Para isso o curso deveria ser capaz de mostrar escritas em sistema Sign Writingâ correspondendo às configurações das mãos em língua de sinais. Foi desenvolvida uma proposta de Web Based Training, tendo por base um curso de escrita de língua de sinais para pessoas ouvintes e surdas, objetivando a aprendizagem da escrita de sinais através da Internet. Um dos objetivos de utilizar o paradigma de WBT é criar um ambiente com recursos hipermídia e hipertexto. A construção da comunicação é feita através do correio eletrônico e do chat para desenvolver o pensamento, a habilidade de escrever e a interação entre os usuários, constam ainda práticas em exercícios e espaços para questionamentos.

Cultura Surda

Do ponto de vista da Cultura Surda, usar a língua portuguesa escrita significa não só que as relações pessoais entre surdos que são contemporâneos uns dos outros e estão distanciados no espaço, precisam ser mediadas por elementos culturais- comunicativos que não lhe são próprios. Significa também que as expressões culturais-comunicativas do surdos de uma época só podem ser registradas em forma escrita através desses elementos, o que implica necessariamente a intervenção de um processo de tradução entre as Línguas de Sinais e falada que estão em questão.

Teatro, narrativas, literatura surda em geral, só podem ser escritos após serem vertidos para uma língua falada, mesmo quando criados originalmente em Língua de Sinais. Os surdos não podem construir sua própria escrita de acordo com sua maneira de sinalizar. A escrita, o poder e a tecnologia são parceiros nas narrativas ocidentais da origem da civilização. A cultura surda está minimamente registrada, porque as coisas que os surdos vivem não conseguem escrever em sua própria língua.

A conseqüência educacional de os surdos serem alfabetizados em uma língua oral, e não em uma língua de sinais é dramática, seus resultados concretos são: a extrema dificuldade de leitura dos surdos, sua dificuldade de acesso à literatura em geral e a enorme dificuldade de produzir textos.

Educação dos Surdos

O conhecimento da língua falada, e o decorrente domínio da escrita, não ocorre de maneira natural para as pessoas surdas. A língua que elas percebem e utilizam de maneira natural, é a língua de sinais, que constitui-se na sua língua materna (L1). No caso do Brasil, a língua portuguesa é considerada como uma segunda língua (L2), assim como, por exemplo, o inglês o seria no Brasil para as pessoas ouvintes.

As línguas ditas L2 necessitam de metodologias e recursos adequados para seu ensino-aprendizado, mantendo sempre como referencial a língua L1.

A falta de conhecimento da Cultura Surda , que é desconsiderada a partir do momento em que sua língua não é usada como referencial, gera uma série de problemas no processo de ensino-aprendizado, principalmente, na comunicação e aquisição de conhecimentos pelo próprio surdo e no estabelecimento de sua identidade surda.

A quase totalidade dos trabalhos desenvolvidos com auxílio da informática, direcionados às pessoas surdas, não se preocupam em reconhecer aspectos de sua cultura. O principal enfoque deste trabalho será a língua de sinais, a qual deve fazer parte da educação de pessoas surdas tanto quanto a língua oral faz parte da educação das pessoas ouvintes.

A escrita de sinais

Já existem muitos trabalhos científicos que comprovam a necessidade da criança surda aprender a língua de sinais em primeiro lugar, mas faltam trabalhos sobre a necessidade da alfabetização em escrita de sinais e, mais do que isso, faltam trabalhos de divulgação sobre a tecnologia desta escrita.

A linguagem sem escrita própria é passageira, menos precisa, depende do momento, do lugar, de quem comunica e da memória. A escrita é a representação de um sistema primário que é, em geral, a fala. As crianças ouvintes têm facilidade de aprender porque copiam os fonemas. As crianças surdas que se comunicam por sinais também precisam representar pela escrita a fala própria delas que é viso-espacial. Quando as crianças conseguem aprender uma escrita que é representação de sua língua natural amadurecem e melhoram todo o seu desenvolvimento cognitivo.

O escrever e ler em língua de sinais, para o surdo, é o caminho natural em todo este contexto. Ou será que para uma criança ouvinte submetida a uma educação bilíngüe, se preconizaria como acertado apenas darlhe condições para que lesse e escrevesse em sua segunda língua estabelecendo para sua primeira língua apenas o papel conjuntural da comunicação presencial e imediata? Na verdade, este fato aconteceu muitas vezes na história da humanidade quando por razões políticas populações foram forçadas a esquecer suas línguas naturais ou a usá-las apenas em privado. Sabe-se também, pelas constatações da sócio-lingüística o quanto estas populações foram prejudicadas em vários aspectos por estes procedimentos coercitivos.

Não é correto impor ao surdo esta limitação, quando sua condição o impede de falar e compreender com amplitude a sua segunda língua. O alfabeto usado para o português é o ponto terminal da longa história da escrita ocidental. O sistema Sign Writing® que representa as unidades gestuais fundamentais, suas propriedades e relações tem como ponto de partida a língua materna dos surdos. Divulgá-lo pela Internet por meio de um curso a distancia, tornando-o acessível a grande parte da comunidade surda brasileira, é tornar acessível a esta comunidade uma ferramenta necessária e importante.

A criança estimulada a escrever busca representar pela escrita a língua pela qual se expressa. Ela tenta desenhar os sinais. O código Sign WritingÒ deve ser normalmente introduzido como o alfabeto da língua portuguesa. Será uma alfabetização paralela ao aprendizado das duas línguas. A tecnologia da informática traz muitas possibilidades para usar a escrita de sinais. Certamente esta tecnologia abrirá novos caminhos como por exemplo, um programa que traduza de uma escrita para a outra, como se encontra do inglês para o português e vice-versa.

Quando as escolas iniciaram o uso da LIBRAS, esta linguagem era só uma ferramenta para facilitar a comunicação, depois comprovou-se que ela é uma língua completa que o surdo deve aprender, para que possa se desenvolver em muitos sentidos. A escrita de sinais é a mesma coisa, agora parece ser apenas mais uma ferramenta, uma curiosidade mas, quando se pensa que não ser analfabetos em sua própria língua é importante, vamos compreender que a escrita de sinais para o surdo é muito importante.

Tem-se a consciência que este trabalho, desenvolvido com a escrita de sinais, é muito pouco dentro de uma metodologia que significa tanto para as pessoas surdas. Porém é extremamente importante e útil para esta comunidade, porque a pessoa vai para a escola, principalmente para deixar de ser analfabeto, e a maioria dos surdos hoje, depois de muitos anos de estudo, quando sai da escola continua analfabeto.

O trabalho que se realiza na Escola Especial Concórdia entra no quarto ano de implementação e algumas observações importantes já podem ser colocadas.

Muitos alunos surdos quando começam aprender a escrever pensam que o português escrito é a representação da língua de sinais que eles usam. Quando os alunos começam a aprender a escrita de sinais eles conseguem separar e ver que é outra língua. Trabalhando as duas línguas separadamente e comparando-as o resultado será melhor porque é, assim que, consagradamente acontece a aprendizagem de uma segunda língua.

Os surdos em suas manifestações escritas podem produzir ótimos material, como literatura, poesia, textos, se possuírem o domínio do instrumento necessário para isso.Para a maioria, isto não acontece na língua portuguesa porque a dificuldade de traduzir é imensa o sentido muitas vezes muda, é difícil. Então ninguém faz.

A adaptação do Sign Writing® à LIBRAS produzindo a escrita de sinais brasileira é uma ferramenta adequada para que os alunos surdos cumpram o objetivo de registrar por escrito sua língua visual.

A escrita de sinais desenvolve e amadurece os aspectos cognitivos do surdo organizando seu pensamento e fazendo com que a leitura e escrita alfabéticas contando com uma escrita não fragmentada como parâmetro tenham sua aprendizagem facilitadas. Depois que aprendem os códigos da escrita de sinais, os alunos conseguem escrever respostas com muitos detalhes, refletindo seus pensamentos de forma mais completa, e não como aparecem, geralmente, os escritos dos surdos em português, só com poucas palavras.

A possibilidade de comparar as duas escritas abre novas possibilidades de compreensão da estrutura das duas escritas tornando-as mais acessíveis.

O interesse de muitos surdos por aprender a escrita de sinais é grande, maior ainda o de usar o Sign Writer® ( editor de textos em línguas de sinais para o sistema operacional DOS ) nas aulas de computação.

A inserção no currículo da escrita de sinais só na 7a série é um fato que precisa ser alterado inserindo-a no momento apropriado, qual seja na, fase anterior e em seguida simultânea à alfabetização em português. Darlhe continuidade é crucial para o desenvolvimento do trabalho escolar com surdos viso-dependentes assim como o é com o Braille para o trabalho escolar com os cegos.

Outros trabalhos importantes surgiram no Brasil reafirmando a convicção de que este é um caminho válido para ajudar a solução da escrita dos surdos há tanto anos alvo de pesquisas que não tem melhorado a situação. Pode-se citar o do doutor Fernando Capovilla, da Universidade de São Paulo, que está por publicar um dicionário completo de sinais escritos por meio do Sign Writing® com 900 páginas e 1600 ilustrações .

Na construção deste site, que oferece aulas de escrita de sinais, foram levados em consideração todos os requisitos de qualidade exigidos no desenvolvimento de um software Educacional, segundo [CAM 96]. A construção das páginas com o conteúdo foi distribuída de forma ordenada, de maneira a permitir que o usuário não se perca durante a navegação.

Houve uma grande preocupação com a padronização das cores e das fontes em todas as páginas do site para que não ocorresse poluição visual.

A linguagem usada na descrição do conteúdo é muito informal com termos utilizados em linguagem coloquial. Em relação aos exercícios, deu-se prioridade a clareza e objetividade dos conteúdos. Todos os links utilizados no site possuem saídas para as páginas existentes.

Quanto à analise de viabilidade, o desenvolvimento do software foi considerado viável, pois utilizou recursos técnicos (software, hardware e livros) de fácil acesso.

Os hiperdocumentos/hipermídias utilizados no site possuem vida útil não só pelo assunto tratado, uma língua viva, como pela via de acesso a este documento, a internet, cada dia mais difundida pelo mundo.

O conteúdo do site possibilita aos desenvolvedores um aumento inesgotável de informações, vindas de sugestões de usuários (e-mail).

O objetivo do site além de contribuir para complementar as informações disponibilizadas aos alunos com os textos, é também promover a prática do que foi estudado, resolvendo exercícios de fixação de conteúdo.

Todo o desenvolvimento do site teve como ponto principal, a possibilidade de acesso ao site por qualquer pessoa desde que conhecedora da LIBRAS.

Na Escola Especial Concórdia os alunos que tiveram oportunidade de acessar o site o fizeram com facilidade, ou não, conforme seu maior ou menor domínio da ferramenta computador. As perguntas foram bastante voltadas para o significado das palavras despertando uma curiosidade mais comprometida com a descoberta do que quando perguntam pelo significado das palavras em português pois percebem que, embora muitas vezes, não conheçam os códigos, estes estão mais próximos da língua que lhes é natural e portanto lhes são mais familiares.

Outro aspecto interessante observado foi o de que os alunos que possuem computador em casa mostraram interesse em trabalhar sozinhos o que aponta para uma maior possibilidade de desenvolver sua capacidade de leitura e escrita.

SIGN WRITING: um sistema de escrita para Línguas de Sinais

Utiliza-se neste trabalho a escrita de sinais baseada no sistema Sign Writingâ criado em 1974 por Valerie Sutton (http://www.signwriting.org). É um sistema de representação gráfica das línguas de sinais que permite através de símbolos visuais representar as configurações das mãos, seus movimentos, as expressões faciais e os deslocamentos corporais.

O alfabeto Sign Writingâ pode ser comparado com o alfabeto usado para escrever em português, inglês, espanhol, francês, etc.. que é universal mas usado para escrever diferentes línguas. Desta mesma forma, os símbolos no alfabeto Sign Writingâ também podem ser utilizados para escrever diferentes línguas de sinais. Atualmente este sistema de escrita de língua de sinais está sendo utilizado em diversos países como: Brasil, Dinamarca, Irlanda, Itália, México, Nicarágua, Holanda, Espanha, Inglaterra Estados Unidos. [SIG 98].

Estrutura do Sign Writing

O Sign Writingâ é definido por três estruturas básicas: posição de mão, contato e movimento. A figura 1 ilustra algumas configurações de mão e suas respectivas representações abaixo estão dispostas com a palma da mão voltada para o enunciador. Quando a mão estiver de lado, metade da representação é pintada de preto e a outra de branco e quando a palma está de costa, é toda preta. [CAM 98].

  • Posição de Mão: as configurações básicas são mão fechada, circular aberta (figura 1) e a mão pode estar paralela ou perpendicular ao chão. O Sign Writingâ define 10 configuração básica de mão que são agrupadas de acordo com os dedos (quantidade e configuração) que são usados. Cada grupo possui um símbolo que o identifica e estes formam uma sequência de variações do símbolo inicial. A figura 2 apresenta as variações para o grupo 1.
  • Movimentos: podem ser classificados em duas categorias: movimento de dedos e de mãos.
  • Contato: existem seis formas de representar o contato dos elementos que compõe o sinal, seja mão com mão, mão com corpo, mão com cabeça. São eles: tocar, pegar, bater, esfregar, escovar e entre dois elementos. A figura 3 ilustra alguns destes contatos.

Educação a Distância (EAD) é uma forma sistematicamente organizada de auto-estudo, onde o aluno se instrui a partir do material que lhe é apresentado; pressupõe a combinação de tecnologias convencionais e modernas que possibilitam o estudo individual ou em grupo, através de métodos de orientação e tutoria à distância. [NET 99] A primeira forma de EAD foram os cursos por correspondência na Europa. Esse meio de EAD foi muito utilizado até a metade deste século, até o rádio e televisão instrucional tornaram-se populares. No entanto, com o surgimento de tecnologias interativas mais sofisticadas, educadores passaram a utilizar ferramentas como: e-mail, BBSs e videoconferência. Um serviço da Internet que tem sido muito utilizado é o WWW, que possibilita a elaboração de cursos à distância com avançados recursos de multimídia. [PER 88]

A EAD tem por objetivo fazer com que o aluno tenha consciência do seu estudo, sem que haja o controle total de algum instrutor, com isso dá-se também o amadurecimento do aluno com relação ao ensino. Caracteriza-se pela não ocupação de uma sala de aula como meio entre o aluno e o professor, já que a maior característica da EAD é a separação do aluno e do professor no tempo e/ou no espaço [PER 88].

Os programas criados para a EAD devem, também, se deter nas características dos alunos, como por exemplo, sua idade, cultura, nível de Educação e se o aluno já teve algum tipo de experiência com método de EAD [TAR 99].

Informática na Educação Surda

A Educação de surdos não é diferente da Educação Geral em seu objetivo porque ambas desejam o desenvolvimento harmonioso do educando sob os aspectos tanto individual como social. Elas diferem nas estratégias utilizadas de acordo com sua clientela, oportunizando assim desenvolvimento de alternativas e atendimento diferenciado.

“A diferença básica entre a educação geral e a educação especial é dada em termos de local de atendimento, tipo de material pedagógico, currículo trabalhado, profissionais envolvidos e individualização no atendimento”. [CAM 98]

As condições individuais das crianças e jovens surdos colocam necessidades educacionais muito diferentes da maioria das crianças e jovens. Para que sua educação seja garantida são necessários um conjunto de recursos e serviços educacionais organizados para apoiar, suplementar e no caso dos surdos usuários da LIBRAS, substituir os serviços educacionais comuns.

O computador como ferramenta auxiliar no processo ensino e de aprendizagem, possibilita o aluno vivenciar situações que facilitam o desenvolvimento de suas potencialidades de maneira lúdica. A nova sociedade é informatizada. Além deste motivo, suficiente para incluir na educação dos surdos esta possibilidade, é ainda, a surdez uma diferença que torna seus portadores pessoas que se comunicam de forma visual, perfeitamente compatível com esta ferramenta que passa a ser prioridade em sua educação.

Os surdos são também uma minoria lingüística com características muito particulares, face as dificuldades que enfrentam na aquisição de sua linguagem. Estas dificuldades fazem com que as histórias de cada um, tornem necessárias abordagens pedagógicas individualizadas que possibilitem a construção do conhecimento pelo aprendiz de forma individual sem abrir mão de um ambiente de cooperação que encoraje no estudante o dedicar-se as tarefas desafiadoras.

“Ambientes interativos em rede podem ser vistos como sistemas abertos, heurísticos, condizentes com a abordagem construtivista/interacionista, uma vez que propiciam facilidades de pesquisa, vasta quantidade de informações e meios de interação com outros usuário, favorecendo a colaboração, cooperação, aquisição e construção de novos conhecimentos de maneira crítica e criativa”. [COS 96]

A comunidade surda é uma nação, uma pátria, sem localização geográfica. Como já se viu, 90% dos surdos são de famílias ouvintes e a nacionalidade que eles passam a integrar consiste em sua forma própria de comunicar-se.

Uma comunidade com estas características é a que pode, desde que com as ferramentas adequadas, beneficiar-se mais do que qualquer outra de um ambiente em rede que ultrapasse os limites geográficos e possibilita a interação entre seus membros em torno de objetivos comuns.

[SAN 98] cita que estudos e pesquisas já avançaram suficientemente para que se possa assegurar que a aprendizagem não pode ser explicada única e exclusivamente a partir da perspectiva cognitiva/individualista pois esta envolve, também, a dimensão social e afetiva, onde processos de interação com o objeto social desempenham papel fundamental. Há algum tempo atrás, o que se podia observar no uso do computador por surdos, eram programas para treinamento de voz ou aquisição de vocábulos sendo utilizada a língua portuguesa como meio para tal. Estes programas são úteis apenas para uso clínico na terapia da fala. O objetivo deste trabalho é outro: visa a educação integral dos Surdos usuários da Língua de Sinais.

Esta nova linha de desenvolvimento de software é regida, em primeiro lugar, pelo respeito à língua natural dos surdos, a língua de sinais, seja em sua interface ou na sua utilização. “O respeito mútuo aparece, portanto, como condição necessária da autonomia, sobre o seu duplo aspecto intelectual e moral. Do ponto de vista intelectual, liberta a criança das opiniões impostas, em proveito da coerência interna e do controle recíproco. Do ponto de vista moral, substitui as normas da autoridade pela norma imanente à própria ação e à própria consciência, que é a reciprocidade na simpatia”. [FAG 98]

A ferramenta computador interessa muito aos surdos jovens quando eles constroem os softwares educacionais específicos para surdos. As crianças surdas sempre perguntam onde está o software que apresenta a língua de sinais. O computador, como ferramenta, aliada ao uso de softwares que utilizem a língua de sinais escrita oportuniza para esta clientela o desenvolvimento de várias possibilidades:

  • Aquisição da língua de sinais escrita;
  • Transmissão direta do pensamento para a forma escrita da língua;
  • Conhecimento da cultura de informática;
  • Investigações sobre história e cultura surda;
  • Fortalecimento da identidade surda com o conseqüente aumento da auto-estima.

“A habilidade, com que hoje as escolas, tanto de ouvintes como de surdos, precisam trabalhar, não é mais a de transmitir quantidades de informações, mas desenvolver nos alunos a autonomia, a cooperação e a capacidade constante de aprender a aprender de acordo com os desafios e problemas que a sociedade impõe”. [VAL 99]

Para os surdos o uso destas tecnologias é um novo fator que vem possibilitar-lhe a inclusão em muitas atividades de vida diária que antes não estavam ao seu alcance. O TDD (telefone para surdos no qual as mensagens podem ser trocadas aparecendo por escrito, sucessivamente, em um mostrador de cristal líquido) e outras variantes como o bip, o correio eletrônico, os chats e as páginas WWW, possibilitam aos surdos comunicarem- se a distância com seus pares, sem intermediários e em tempo instantâneo. Estas comunicações podem se dar dentro da mesma cidade, ou não. O horizonte de possibilidades é tão amplo quanto o mundo.

“Seja aproveitando as possibilidades de pesquisa, compras, transação bancárias, seja através do correio eletrônico ou das salas de bate-papo, os Surdos brasileiros estão aproveitando a Internet mais do que ninguém! Todo e qualquer Surdo que entre em contato com Internet vira fã de carteirinha. O sonho de consumo mais comum hoje na comunidade Surda é, evidentemente, ter seu próprio computador e acesso à rede”. [FEN 00]

Infelizmente o número de surdos que tem acesso e fazem uso destes meios é, ainda, minoritário. Mas, estes recursos são eficientes e se espalham rapidamente. Características do ser humano são a vontade e a capacidade de progredir e de comunicar-se; por isto, estas possibilidades interessam muito às crianças surdas.

“A contínua atualização e aperfeiçoamento de professores é uma necessidade diante dos desafios e das mudanças rápidas que caracterizam a Sociedade desse início do século XXI. O rápido e crescente desenvolvimento da Informática, as mudanças de paradigmas, o emprego de novas tecnologias, a alteração de valores e costumes, as alterações ambientais e comportamentais são de tal magnitude que muitas vezes as instituições sociais não têm conseguido acompanha-las e propor novas maneiras de capacitação”. [VAL 99]

Interface para Educação de Surdos

Tão importante quanto a funcionalidade de um programa de computador é seu aspecto final, sua apresentação, pois é ela que praticamente cativa o usuário. Por isso, como observa [CAM 96], devem ser evitados problemas como o uso de uma comunicação não eficaz, desorganização, falta de padronização, uso extravagante de cores, tamanhos inadequados de letras e desenhos, uso não adequado de tecnologias disponíveis, entre outros.

Analisando-se alguns softwares ditos para Educação de Surdos, pode-se observar que alguns sequer respeitam as especificidades de seu público alvo e nem fazem uso de recursos que poderiam diminuir as dificuldades da interface homem-máquina.

Ainda segundo [CAM 96], antes da construção de software para portadores de alguma deficiência ou dificuldade deve-se, verificar quais as necessidades do sujeito e avaliar quais as preferências deste quanto a um ou outro sistema de representação para comunicação para, então, se projetar a interface do programa.

Hoje, maioria dos surdos formados no 2º grau usam os computadores. Os que não são formandos no 2º grau em geral usam pouco o computador pois tem dificuldade de ler e escrever em português.

Observa-se que os surdos geralmente utilizam o programa do ICQ chat. Não usam outro programa pois sentem-se unidos por este programa em um familiar bate papo.

Usando o programa ICQ chat os surdos sentem-se donos do espaço da sala de bate-papo e acessam espaço nacional e internacional. A maioria dos surdos não se sente bem conversando com os ouvintes em outros programas do chat pois ouvintes não conhecem a Cultura Surda e a forma de escrita surda. Conseguem conversar com os ouvintes só quando estes conhecem a Cultura Surda.

Os surdos que não têm Identidade Surda geralmente apresentam poesias e textos que parecem com os dos ouvintes, mostram as capacidades deles dentro da página de Internet. O mesmo acontece em outros países.

Observa-se que nas páginas da Internet: WDF (World Deaf Federation); Infsord (Informacion de Surdos), NAD (National Associacion Deaf) entre outras, geralmente aparecem os desenhos da língua de sinais, pois isso é próprio da Cultura Surda. Estes programas são procurados pelos surdos que têm identidade surda, procuram os desenhos de língua de sinais para mandar por e-mail, pois estão em sua própria e inteligível língua, mas estes desenhos são difíceis de encontrar.

Bibliografia

[CAM96] CAMPOS, Márcia de Borba. Sistema Hipermídia para apoio às relações espaço temporal e lateralidade baseado em hipermídia. Dissertação de Mestrado. Porto Alegre: UFRGS, 1996.

[CAM98] CAMPOS, Márcia de Borba. SIGNTALK: chat baseado na escrita de língua de sinais. In: Congresso Iberoamericano de Informática Educativa Especial – CIEE’98. Neuguén, Argentina, 1998. Disponível em CD-ROM.

[COS 96] COSTA, Rosa Maria. M. da, XEXÉO, Geraldo B. A Internet nas Escolas: uma proposta de ação. IN: 7º Simpósio Brasileiro de Informática na Educação, Anais. Minas Gerais, 1996.

[FAG 98] FAGUNDES, Lea. Informática na Educação: Teoria e Prática. Curso de Pós-Graduação em Informática na Educação. Porto Alegre: UFRGS, vol. 1, n.1, 1998.

[FEN 00] FENEIS, Revista da. Ano II, número 6, 22, Rio de Janeiro, 2000.

[NET 99] NETO, Celso Cardoso. Educação à Distância. http://www.cciencia.ufrj.br/educnet/eduead.htm

[PER 88] PERRATON, 1988 O que é Educação à Distância? http://www.penta.ufrgs.br/edu/edu_1.html

[SIG 98] SUTTON, Valerie. SIGNWRITINGâ: manual. Disponível na Internet. On-line.
http://www.signwriting.org.

[TAR 99] TAROUCO, Liane Margarida Rockenback. Sistemas de Educação à Distância.
http://www.penta.ufrgs.br/edu/edu1_4.html

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