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Joaquim Melro
Joaquim Melro
Professor Investigador
Inclusão de estudantes adultos surdos no ensino recorrente nocturno: uma (segunda) oportunidade para quem?!
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Publicado em 2014
Revista Interacções - v. 10, n. 33, pp. 128-162
Joaquim Melro
Margarida César
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Resumo

Em Portugal, a educação inclusiva tem vindo a configurar, e a ser configurada, por documentos de política educativa (ME, 2008), sublinhando a necessidade de garantir equidade no acesso a uma educação de qualidade (César & Ainscow, 2006). Estes princípios assumem particular importância para os estudantes adultos surdos, que precocemente abandonaram a Escola e a ela regressaram para (re)construir projectos académicos e profissionais. São disso exemplo os que frequentam o ensino secundário recorrente noturno. Contudo, passar dos princípios às práticas revela-se complexo. Participantes de uma cultura e falantes de uma língua (Língua Gestual Portuguesa - LGP) minoritárias, muitos dos estudantes adultos surdos continuam a experienciar barreiras ao acesso ao sucesso escolar e social (Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2012, 2013). Focamo-nos nos processos de inclusão destes estudantes (N=11) no ensino secundário recorrente noturno, numa escola pública de Lisboa. Assumimos uma abordagem interpretativa (Denzin & Lincoln, 1998) e um design de estudo de caso intrínseco (Stake, 1995/2005). Os participantes são aqueles estudantes, os pares ouvintes (N=6), os professores e outros agentes educativos significativos (N=47), bem como o investigador, enquanto observador participante. Os instrumentos de recolha de dados são: questionários, tarefas de inspiração projectiva, entrevistas, observação participante, recolha documental e conversas informais. Recorremos a uma análise de conteúdo narrativa (Clandinin & Connelly, 1998), fazendo emergir categorias indutivas de análise. Os resultados iluminam a necessidade de as escolas valorizarem a diversidade, nomeadamente as características dos estudantes adultos surdos, assumindo sustentadamente a inclusão como elemento-chave do seu empowerment, individual e social.

Introdução

Um dos desafios colocados às sociedades actuais consiste no desenvolvimento de cenários de educação formal que efectivem o direito de todos a uma edução de qualidade (UNESCO, 1994), afirmando-se como inclusivos e contribuindo para a superação das desigualdades sócio-económicas que ainda subsistem (UNESCO, 1994, 2010). Este e outros desafios têm configurado diversos documentos de política educativa, como a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994), de que Portugal é signatário. Este documento reconhece ser dever das sociedade ditas democráticas desenvolver sistemas educativos que garantam a afirmação de uma educação inclusiva (EI), isto é, uma educação que propicie a todos os estudantes equidade no acesso ao sucesso escolar e social (César & Ainscow, 2006; Rodrigues, 2006). A Escola deve celebrar a diversidade (Armstrong, Armstrong, & Barton, 2000). Assim, a Escola inclusiva é multicultural (Cortesão, 2006), cumprindo o dever ético-político de acolher os estudantes que participam nas várias culturas, que construíram diferentes representações sociais e expectativas sobre a Escola, configurando trajectórias de participação ao longo da vida diversificadas (César, 2013a, 2013b). Realça-se a necessidade de a Escola se afirmar como mediadora cultural, facilitando as transições entre culturas (César, 2013a, 2013b; César & Courela, 2012; Melro, 2014; Melro & César, 2012, 2013). Isto pode ser conseguido se a Escola desenvolver uma praxis inclusiva e intercultural que favoreça as expectativas positivas quanto aos estudantes que, como os surdos, participam em culturas minoritárias e vulneráveis, frequentemente desvalorizadas em termos escolares e sociais, com impactes nas trajectórias de participação ao longo da vida, não raras vezes configuradas pela exclusão (Borges & César, 2012; César, 2009; 2013a; 2013b; Melro, 2014; Melro & César, 2012, 2013).

Os princípios da EI assumem particular relevância para os estudantes adultos surdos e pouco escolarizados, que se encontram a frequentar sistemas formais de Educação de Adultos (EA), como o ensino recorrente nocturno, no sistema de módulos capitalizáveis (SMEC). Depois de a terem precocemente abandonado, regressam à Escola, reconhecendo neste regresso uma oportunidade de romperem com um passado marcado pela exclusão escolar e social, redesenhando trajectórias de participação ao longo da vida mais promissoras. Cumpre-se, assim, um dos princípios que ilumina a EA inclusiva: propiciar a todos os adultos equidade no acesso a uma educação ao longo da vida (Canário, 2000; Courela & César, 2012; Finger & Asún, 2003; Lima & Guimarães, 2011). A Escola deve abraçar estes princípios, efectivando-os (Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2013), desenvolvendo uma EA inclusiva e intercultural, que responda adequadamente à diversidade destes estudantes, devolvendo-lhes a esperança perdida e permitindo-lhes traçar um futuro mais inclusivo.

Tendo em conta que muitas das escolas ainda vivenciam fragilidades em efectivar os princípios da educação inclusiva, nomeadamente os referentes à educação de adultos surdos pouco escolarizados (Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2010, 2013), decidimos realizar um estudo de caso sobre a inclusão de estudantes com estas características (N=11), numa escola pública de Lisboa, frequentando o ensino recorrente nocturno, no SMEC. As questões de investigação que abordamos são: (1) Que representações sociais sobre a inclusão dos estudantes adultos surdos no ensino recorrente nocturno, no SMEC, são apresentadas por estes participantes; e (2) Quais os elementos facilitadores da inclusão escolar e social destes estudantes?

(Re)Configurando os Surdos

Borges (2009), Freire (2011) ou Bagga-Gupta (2004) consideram ser dois os paradigmas que mais recentemente têm abordado os surdos: (1) o paradigma médico-terapêutico, que assume a necessidade da medicalização e oralização dos surdos, perspectivando-os como deficientes; e (2) o sócio-antropológico, que os reconhece, já não como indivíduos deficitários, mas como participantes de culturas e falantes de línguas minoritária. Embora ontológica, epistemológica e culturalmente opostos, estes paradigmas e respectivos impactes na educação de surdos têm vindo a coexistir, ora ignorando-se, ora excluindo-se mutuamente, ora prevalecendo um sobre o outro, ora dialogando entre si, ainda que de forma ténue ou pouco conseguida. É importante que, sobre os surdos e a educação que lhes é propiciada, se ultrapassem dicotomias ontológicas, epistemológicas, sociais e culturais, facilitando as transições entre culturas (César, 2013a), a interculturalidade e a inclusão (César, 2012b, 2013b), favorecendo “ir além da grande divisão que subjaz a estas duas tradições” (Bagga-Gupta, 2007, p. 46). Destaca esta autora que tais abordagens permitem afirmar um “terceiro espaço” (Bagga-Gupta, 2004, p. 58, itálico no original) ou uma “terceira posição” (Bagga-Gupta, 2004, p. 70), ou seja, espaços e tempos “onde a multidisciplinaridade seja um ponto de partida necessário” (p. 57), onde “as polarizações não sejam resolvidas através de um processo de amalgamento ou através do domínio de uma perspectiva sobre a outra” (p. 58), onde “as noções tradicionais da surdez, das identidades humanas e das competências linguísticas sejam desafiadas” (p.57), onde, enfim, “a emergência de novas vozes e perspectivas, habitualmente marginalizadas” (p. 51), propiciem que, sobre os Surdos, se possa assumir uma abordagem mais “inclusiva e robusta” (p. 59).

Por considerarmos ser necessária uma ruptura com princípios e práticas culturais hegemónicas, excludentes e segregadores subjacentes ao paradigma médico-terapêutico, assumimos o paradigma sócio-antropológico, advogando a urgência da Escola e as sociedades assumirem o dever de desenvolverem formas de actuação e de reacção inclusivas e interculturais, que valorizem devidamente a diversidade dos surdos, nomeadamente as língua gestuais e outros elementos sócio-culturais que os caracterizam. Importa que os surdos sejam (reconfigurados) pelo paradigma que ora assumimos, propiciando-lhes afirmar um futuro mais equitativo e promissor, fazendo com que vivências marcadas pelo desconhecimento, pelo medo, pelo preconceito, pelo desespero, pela impotência, pela culpa ou pelo sofrimento cedam à esperança e à acção consistente e com sentido.

Ao discutirem as convergências e divergências que têm configurado a educação dos Surdos ao longo dos tempos, Carvalho (2007), Bagga-Gupta (2004), Baptista (2008) ou Melro (2003) sublinham que uma das problemáticas que mais se destaca é a que diz respeito aos sistemas linguísticos e respectivos modos de comunicação: o oralismo, o gestualismo, a comunicação total e o bilinguismo. Ocultando, limitando e proibindo as línguas gestuais em contextos educativos e institucionais, o oralismo não reconhece os surdos como participantes de uma cultura com especificidades sociolinguísticas próprias, ancorando a praxis educativa no desenvolvimento de um currículo hegemónico de cariz oralizante e remediador (Afonso, 2008; Bagga-Gupta, 2004, Freire, 2011; Melro, 2003, 2014; Melro & César, 2009, 2012). Corroborando o paradigma da normalização e da integração (César, 2012b; Rodrigues, 2003), o oralismo preconiza o desenvolvimento de um currículo monocultural e de cariz oralizante, visando transformar os surdos em ouvintes (Bagga-Gupta, 2004; Freire, 2011). Assim sendo, os únicos que, com legitimidade e propriedade, podem educar os surdos são os ouvintes, ou quanto muito (excepcionalmente?), os surdos oralizados ao serviço dos ouvintes (Lane, 1997) que, quais agentes colonizadores, focam a praxis educativa não no desenvolvimento de um currículo intercultural, mas na reabilitação (conversão?) dos Surdos, desmutizando-os, remediando-os, normalizando-os ou, numa só palavra, oralizando-os.

Do lado oposto, o gestualismo assume as línguas gestuais como as mais adequadas, se não as únicas, ao desenvolvimento de ferramentas mentais como a língua e o pensamento, que são configurados e configuram a comunicação e as aprendizagens (Borges & César, 2012; Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2013). Ao reconhecer que a mediação dos processos de ensino e de aprendizagem seja realizada através das línguas gestuais, o gestualismo contribui para que elas sejam consideradas, pelas sociedades, como legítimas. Contudo, ao associar as línguas orais a instrumentos ao serviço da colonização, da normalização e, até, do extermínio dos surdos (Lane, 1992), o gestualismo assume-as como ameaça à afirmação das culturas surdas, argumentando serem estas línguas um impedimento (atentado?) aos processos de desenvolvimento emocional e sócio-cognitivo dos surdos, bem como do acesso ao sucesso académico e social (Bagga-Gupta, 2004; Lane, 1992).

Sem deixarmos de reconhecer a importância que o gestualismo assume no reconhecimento e valorização dos surdos, de que a afirmação das línguas gestuais como legítimas é exemplo, diremos que, à semelhança do que ocorre com o oralismo, o gestualismo preconiza o desenvolvimento de um currículo monocultural e de cariz hegemónico, com a diferença que, aqui, o sistema linguístico que o origina e desenvolve é o gestual, levando muitas vezes à guetização dos surdos e a formas de actuação e de reacção pouco valorizadoras dos ouvintes (Afonso, 2008; Bagga-Gupta, 2004). Enquanto posições epistemológicas e políticas extremadas, tanto o oralismo com o gestualismo esquecem que as interacções sociais e os processos comunicativos que subjazem aos processos educativos dos indivíduos que, como os surdos, participam em diferentes culturas, só em situações excepcionais e restritas (ou restritivas?), são configurados pelo uso exclusivo de um único modo de comunicação (Bagga-Guppta, 2004; Freire, 2011; Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2012, 2013), levando à segregação, à discriminação e à exclusão de uns e de outros. Assim, numa tentativa de ultrapassar a dicotomia gestualismo versus oralismo, bem como de minimizar os impactes escolares e sociais associados, desenvolveram-se princípios e práticas educativas de comunicação total, assumindo que a educação dos surdos deve recorrer a todos os modos de comunicação disponíveis. Os processos educativos são focados nas diversas capacidades comunicativas apresentadas pelos surdos: auditivas, visuais, orais, gestuais, escritas, entre outras (Carvalho, 2007); Freire, 2011).

A par de outros elementos, os autores que subscrevem a comunicação total sublinham ser necessário que os professores, as famílias e outros agentes educativos significativos desenvolvam competências multilinguísticas, possibilitando que, em determinados contextos, cenários e situações, possam optar por utilizar elementos das línguas gestuais acompanhados da respectiva oralização e vice-versa, enquanto noutros apenas gestos ou palavras escritas e orais (Freire, 2011). No entanto, a diversidade de opções que parece configurar a praxis educativa subjacente à comunicação total pode levar os estudantes, os agentes educativos, as famílias e outros significativos a confundir (ou fundir?) dois sistemas linguísticos autónomos e estruturalmente diferentes entre si (gestual e oral). Ao considerar as línguas gestuais como sendo a gestualização das línguas orais e estas como sendo a oralização daquelas, ocultam que estes processos, ao contrário de uma língua, não têm qualquer valor linguístico e, por conseguinte, qualquer função semântica, sintáxica e pragmática – elementos linguísticos considerados essenciais para desenvolver processos mentais complexos, de que os metalinguísticos e metacognitivos são exemplos (Vygotsky, 1932/18964).

Sem deixarem de reconhecer importância às abordagens educativas preconizadas pela comunicação total, como o sistema bi-modal ou a palavra complementada, Melro (2003), Bagga-Gupta (2004) ou Freire (2011) consideram que a comunicação total repete, no essencial, o preconizado pelo gestualismo e pelo oralismo: a incapacidade de desenvolver um currículo contra-hegemónico (Afonso, 2008) e, por isso, inclusivo, perpetuando, assim, dicotomias ontológicas e epistemológicas pouco favoráveis a cenários educativos multi- e interculturais.

É num contexto de inclusividade e de interculturalidade que emergem os princípios e práticas educativas que configuram o bilinguismo. Habitualmente designado em inglês por Bi-Bi programs, abreviatura da expressão inglesa Bilingual-Bicultural (Lane, 1992), o bilinguismo é considerado por Freire (2011), Bagga-Gupta (2004), Borges & César (2014) ou Melro (2003) como uma abordagem educativa e cultural complexa e diversa, cujos princípios consistem: (a) no reconhecimento e valorização das línguas gestuais e orais; (b) no acesso atempado e consistente a estas línguas; (c) na afirmação de ambientes formais e institucionais educativos e sociais multilingues ou, pelo menos, bilingues, (d) na mediação dos processos de desenvolvimento emocional e sócio-cognitivo e das aprendizagens através das línguas gestuais e orais; (d) no desenvolvimento de um currículo que propicie interculturalidade e inclusividade e; (e) na emergência de processos identitários positivos e consistentes. A estes elementos deve acrescentaríamos um outro: preconizar práticas educativas que propiciem o desenvolvimento de mecanismo de inter- e intra-empowerment (César, 2013a), facilitadores das aprendizagens com sentido e da participação legítima (César, 2009, 2013a; Courela & César, 2012). Assim, ao contrário do que acontece noutras abordagens educativas, os princípios e as práticas que configuram o bilinguismo não mais perspectivam as línguas gestuais ou orais como ameaças, nem como mero instrumentos de ensino, nem tão-pouco como excludentes na mediação das aprendizagens. Pelo contrário, enquanto ferramentas culturais que dão voz e poder, elas são em muitas situações, cenários e contextos, modos diversos privilegiados através dos quais os surdos, particularmente os que apresentam surdez de grau profundo ou severo, desenvolvem aprendizagens com sentido, bem como processos identitários consistentes, afirmando-se como participantes legítimos das sociedades em que participam (Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2012, 2013).

Sublinhando a necessidade de as práticas serem coerentes com os princípios, autores como Melro (2003, 2014), Melro e César (2009, 2010, 2012, 2013), Bagga-Gupta (2004) ou Freire (2011) destacam que, apesar de nas últimas décadas o desenvolvimento de programas ditos bilingues na educação dos surdos ter assumido relevância educativa e social, muitos professores, na maioria ouvintes e não falantes de línguas gestuais, não se sentem capazes de ensinar num currículo bilingue, apresentando formação pouco adequada para o desenvolver, bem como baixos níveis de proficiência e de literacia nas línguas gestuais, quando não total ausência de conhecimentos (Amaral & Coutinho, 2002). De entre os que as apropriam, medeiam as aprendizagens ou ensinam línguas, alguns evidenciam dificuldades em realizar transições entre estas e as línguas orais, dificultando o desenvolvimento de currículos multilingues, que favoreçam as transições entre línguas e culturas (Melro, 2014; Melro & César, 2010, 2012).

Não menos importante é realçarmos, com Freire (2011) ou com Bagga-Gupta (2004), o papel que o acesso atempado às línguas gestuais assume no desenvolvimento da literacia dos surdos, particularmente a referente à leitura e à escrita das línguas orais, ferramentas mentais essenciais à participação legítima nas sociedades grafo-linguisticamente orientadas. Como destacam estas autoras, o desenvolvimento da literacia dos surdos está muito dependente das condições de apropriação das línguas maternas e de terem tido, ou não, acesso a ambientes sociais, culturais, familiares e educativos propícios ao desenvolvimento da leitura e da escrita das línguas orais, com impactes no desenvolvimento emocional e cognitivo, bem como nos processos identitários. Assim, importa que aos surdos tenham atempadamente acesso a ambientes multilingues e multiculturais, que lhes possibilitem o desenvolvimento de ferramentas mentais, sócio-culturalmente construídas e, por isso mesmo, situadas, bem como o desenvolvimento das funções mentais superiores, ou seja, o pensamento e a língua (Borges & César, 2012; Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2012). Sublinha-se, assim, ser importante favorecer o desenvolvimento de interacções sociais consistentes com os pares e outros significativos, incluindo adultos surdos, falantes de língua gestual, propiciando não apenas a apropriação da língua, mas também a emergência cenários sociais e educativos multilingues e interculturais.

Neste sentido, o desenvolvimento de currículos multilingues, preconizado pelo bilinguismos, aponta para a necessidade de a Escola e as sociedades reconfigurarem os modos como se desenvolvem as interacções Escola/Família, particularmente as respeitantes às transições entre e inter-comunidades, entre e inter-culturas (César, 2009, 2013b). Dá-se, assim, cumprimento a um dos princípios que ilumina os sistemas educativos e sociais inclusivos: assumir todos e cada um como elementos activos e críticos das sociedades em que participam.

Metodologia

Este trabalho faz parte da tese de doutoramento (Melro, 2014), cujo problema em estudo é a falta de equidade quanto às oportunidades educativas vivenciadas, em Portugal, pelos estudantes surdos. Tratando-se de um problema muito vasto, focamo-nos nos estudantes que se encontram a frequentar o sistema de educação formal, no ensino recorrente secundário nocturno, no sistema de ensino por módulos capitalizáveis (SEMC). Pretendemos descrever, analisar, compreender e interpretar os modos como uma comunidade educativa, de uma escola secundária pública de Lisboa, vivencia a inclusão de estudantes adultos surdos (N=11) no ensino recorrente nocturno, dando voz (Bakhtin, 1929/1981) aos participantes que, no terreno, desocultam o sentido do fenómeno em estudo (Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2012, 2013).

Autores como Hamido e César (2009) ou Dezin (2000) sublinham que as interpretações são histórico-socialmente contextualizadas e situadas, isto é, configuradas pelas vivências, conhecimentos e sentimentos de quem as produz. Consideramos que esta posição epistemológica e metodológica se adequa à abordagem interpretativa (Denzin, 2000; Denzin & Lincoln, 1998), por nós assumida, sublinhando a importância dos contextos e das experiências subjectivas na construção dos acontecimentos, desocultando o (s) sentido (s) que os participantes lhes atribuem, permitindo-lhes assumir voz e poder (César, 2009, 2010, 2013a, 2013b). Reconhecendo e valorizando a subjectividade subjacente às interpretações que desenvolvemos, imprimindo-lhe qualidade, seguimos os critérios de qualidade da investigação interpretativa, como a triangulação das fontes, dos instrumentos de recolha de dados, dos investigadores - parte das análises de dados foram discutidas com outros ex-elementos da equipa central do projecto Interacção e Conhecimento (IC) -, bem como de teorias (César, 2013a; Guba & Lincoln, 1998; Hamido & César, 2009; Stake, 1995/2005).

Em coerência com o quadro de referência teórico, com o problema em estudo e com a abordagem interpretativa de cariz etnográfico que a ilumina, esta investigação constitui-se como um estudo de caso intrínseco (Stake, 1995/2005), descrevendo, analisando e interpretando, a partir de descrições densas, os modos singulares, porém, complexos, como uma escola pública secundária de Lisboa inclui estudantes adultos surdos no ensino secundário recorrente nocturno, no SMEC. Esta opção ganha particular sentido por o investigador ter sido docente nessa escola pelo que, ao imergir e emergir no cenário investigativo, como descreve Stake (1995/2005), o caso nos apareceu “(...) pela frente, e sentimo-nos [como que] obrigados a tomá-lo como objecto de estudo” (p. 16). Existe, deste modo, um interesse intrínseco no caso, necessitando o investigador de “(...) aprender sobre este caso em particular. Temos um interesse intrínseco no caso, e podemos chamar ao nosso trabalho um estudo de caso intrínseco” (Stake, 2005, p. 19). Importa sublinhar que esta foi uma escolha epistemológica e metodológica intencional, possibilitando construir conhecimento sobre a inclusão de surdos adultos pouco escolarizados, em cenários formais de educação de adultos, fenómeno ainda pouco investigado, o que torna o estudo de caso num formato particularmente bem adaptado a esta investigação (Merriam, 1988; Stake, 1995/2005)

Pretendo captar a multiplicidade de vozes que configura o sentido do fenómeno em estudo, os participantes são os 11 estudantes surdos que frequentavam o ensino secundário recorrente nocturno, no SEMC, nesta escola, os pares ouvintes (N= 6), que actuaram como informantes privilegiados, os professores e outros agentes educativos (N= 47), bem como o investigador, que actuou maioritariamente como observador participante. Optámos por apresentar e discutir evidências empíricas que iluminam como dois desses estudantes surdos, o Pedro e a Sara (nomes fictícios, para mantermos o anonimato), percepcionavam e vivenciavam a inclusão no ensino regular nocturno, no SEMC. Para mantermos o anonimato dos participantes, optámos por não indicar nem as idades destes participantes, nem o ano de escolaridade que se encontravam a frequentar, salvaguardando princípios éticos que iluminam a investigação interpretativa em educação inclusiva (Allan & Slee, 2008).

Diversificámos os instrumentos de recolha de dados, procurando ter acesso às vozes que, como diria Hermans (2010), iluminam as diferentes I-positions assumidas pelos participantes, as do investigador incluídas (Hamido & César, 2009; Tobin & Kincheloe, 2006). Esta diversidade de instrumentos possibilitou aos participantes expressarem-se na primeira pessoa – entrevistas e conversas informais; parte das observações - e serem conhecidos através de descrições de terceiros, imprimindo inclusividade à investigação desenvolvida (Allan & Slee, 2008; César, 2009, 2010, 2013a; Hamido & César, 2009). Assim, recorremos: (1) à recolha documental (D), procurando obter informação relevante para a elaboração e realização das tarefas de inspiração projectiva (TIP), dos questionários (Q) e das entrevistas (E), bem como para a focalização da observação participante (registada no DB); (2) às TIP, pretendendo conhecer as representações sociais que estes estudantes construíram sobre a escola; (3) ao Q, como meio de ter acesso, num curto espaço de tempo, a informação relevante, por parte de múltiplos participantes, que possibilitasse descrever e compreender determinadas formas de acção e reacção relevantes para a compreensão do caso em estudo; (4); à entrevista semi-estruturada (E), possibilitandonos complementar e aprofundar os dados recolhidos pela recolha documental, pelas TIPs e pelo Q, bem como pela observação (O) e conversas informais (CI), procurando compreender, de modo dialógico e holístico, as interpretações e o sentido que os participantes, incluindo o investigador, atribuíam ao fenómeno em estudo (Merriam, 1988); (5) à O, no formato de observador participante, registada em diário de bordo (DB), possibilitando que o investigador tivesse dos contextos, cenários e situações, bem como dos participantes, uma compreensão mais densa, rica, profunda e abrangente, sublinhando-se o carácter intensivo, em termos de variedade das formas de participação, que a observação participante assume nos estudos interpretativos, particularmente no estudo de caso (Erickson, 1986; Yin, 1990) e; (6) a CI, igualmente registadas no DB, na maior parte das vezes despoletadas pelos próprios participantes, pelo que realçam a dimensão etnográfica do presente estudo, possibilitando, como compreender a cultura que configurou o cenário investigativo.

Ao longo do processo de recolha de dados foi sendo realizada uma análise preliminar, que foi configurando os momentos de recolha e análise posteriores (Hamido & César, 2009; Tobin & Kincheloe, 2006). Procurou-se, assim, realizar uma recolha de dados abrangente e holística. Além disso, a análise preliminar, quando inclui a discussão e análise, em colaboração com outros investigadores, permite o ajuste das lentes do investigador - processo que o acompanhou -, uma vez que essa interacção pode alargar e aprofundar a compreensão do fenómeno em estudo, contribuindo para a qualidade da investigação (Guba & Lincoln, 1998). Os dados foram tratados a partir de uma análise de conteúdo de índole narrativa (Clandinin & Connelly, 1998), sucessiva e aprofundada, procurando-se compreender as trajectórias de participação ao longo da vida dos participantes (César, 2013a; Courela & César, 2012), nomeadamente dos dois estudantes surdos adultos em que nos focamos. Considerámos vários tipos de leitura: (1) leitura flutuante; (2) leituras sucessivas e aprofundadas, fazendo emergir padrões interactivos; e, por fim, (3) leituras que iluminem trajectórias de participação ao longo da vida, em diversos contextos. Através da análise de conteúdo de índole narrativa, fizemos emergir categorias indutivas de análise, cruzando-as com as questões de estudo e abordagens assumidas no quadro de referência teórico. Focámos esta investigação em duas categorias, cuja pregnância de sentido exige reflexibilidade crítica que possibilite descrever, analisar, compreender e interpretar o sentido que ilumina a inclusão dos estudantes adultos surdos no ensino recorrente nocturno, no SEMC: (1) representações sociais sobre a inclusão dos estudantes adultos surdos no ensino recorrente nocturno, naquele sistema de ensino; e (2) elementos facilitadores da inclusão escolar e social destes estudantes.

Seguindo as recomendações de autores, como Holliday (2001) ou Higgs, Debbie e Grace (2009), realçamos, por último, que procurámos que a escrita iluminasse o carácter complexo e histórico-cultural que configura o fenómeno em estudo, assumindo-o como situado num tempo e num espaço, contribuindo para o desenvolvimento da investigação em educação inclusiva, baseada nos princípios e nas práticas que a iluminam.

Resultados

A Sara

A língua que Sara assume como materna é a LGP, pelo que a entrevista cujo excerto transcrevemos foi realizada nesta língua, sendo vídeo gravada e estando presente um intérprete de LGP. Isto significa que a transcrição inclui a interpretação do que foi dito, feita pelo intérprete e pelo investigador, que também fala LGP.

1. Investigador (I) – (...) Eu gostava que a Sara começasse por fazer um bocadinho da sua história, do passado da sua vida enquanto estudante.
2. Sara (S) – Comecei aos três anos na escola Cruz Filipe. No início eu...
3. I – Na escola...?
4. S – Cruz Filipe.
5. I – Fica onde?
6. S – Na avenida... perto da Associação de Surdos. É perto.
7. I – Em Lisboa?
8. S – Sim. Em Lisboa. Comecei aos três anos e senti-me um bocadinho intimidada porque estavam lá outros surdos e estava com a minha mãe. Depois fomos falar com o presidente do colégio e o presidente aceitou eu ficar lá. Passado um ano o presidente morreu e houve um acordo e vários pais fundaram a APECDA.
9. I – O que é que é a APECDA?
10. S – É uma escola de surdos. É a APECDA 2. Com quatro, cinco anos, portanto, em 1973, comecei a frequentar a escola até ao 4.º ano. Não me recordo se no 2.º, se no 3.º ano eu estava com ouvintes, todo o grupo estava... O grupo estava integrado com os ouvintes e à tarde estava com os surdos na APECDA. Portanto, estava em regime integrado: de manhã numa escola com ouvintes e à tarde com a APECDA. A partir do 2.º, 3.º ano. Quando terminei o 4.º ano passei para o 5.º e entrei para a escola Quinta de Marrocos. E fiquei lá. Chumbei dois anos. Portanto, chumbei no 5.º e 6.º ano. Chumbei no 5.º e fiquei, novamente. E depois no 6.º chumbei, reprovei e fiquei, novamente. Fiz, novamente, o 6.º ano. 7.º ano fui para a escola de Carnide. O 8.º e o 9.º continuou a ser na escola de Carnide. Portanto, escola secundária Virgílio Ferreira. Sempre em turma de surdos. Lutámos. Conseguimos fazer aprendizagens. O ensino lá era quase como que se ensinavam os ouvintes. Eu pensava que havia ali um determinada sensibilização [para os surdos]. Embora houvesse, mas o ensino era feito como... como se nós fossemos ouvintes. Era exigente. No 10.º ano passei para Benfica. Para a escola secundária de Benfica, escola secundária José Gomes Ferreira. (...). Igualmente em turma de surdos. Depois, o último ano, tive estágio e fui fazer... fui a uma empresa fazer o estágio (...). Portanto, era assim, nós estávamos na escola e íamos, também, a essa empresa estagiar. No final do curso houve um exame. Transitei, passei o exame e entrei... comecei a trabalhar. Posteriormente, voltei a estudar e estou no ensino recorrente porque... E agora, para fazer o 12.º ano, como o curso era diferente, eu tive de voltar ao 10.º ano. (Sara, E, pp. 1-2)

Volvidos que foram mais de 20 anos após ter abandonado precocemente a Escola, a Sara regressa para concluir o 12.º ano, no ensino recorrente nocturno, no SMEC, num outro curso. Apresentando uma surdez pré-lingual bilateral de grau profundo, é filha de pais ouvintes e assume-se como bilingue. Como podemos observar, a trajectória de participação ao longo da vida desta estudante ilumina muitos dos princípios e das práticas que configuram os últimos 35 anos da história da educação dos surdos em Portugal (Carvalho, 2007). Como evidencia, estes são marcados, num primeiro momento, pelos paradigmas da segregação e da institucionalização dos surdos, segregando-os e excluindo-os, total ou parcialmente, dos espaços e tempos de participação dos pares ouvintes e estes daqueles, dificultando a valorização das culturas em que participam, bem como a realização de transições culturais (Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2012). É disso exemplo, a frequência do Colégio Cruz Filipe ou da APEDECA, instituições direccionadas exclusivamente para o ensino de surdos, sem que, contudo, valorizassem a diversidade linguística deles, preconizando um currículo de cariz reabilitador e oralizante (Amaral & Coutinho, 2002; Carvalho, 2007).

Num segundo momento, a trajectória de participação ao longo da vida, em contexto escolar, é configurada pelo paradigma integração, que tinha subjacente a normalização, ou seja,, como ela afirma, ensinar os surdos como se de ouvintes se tratasse. Assim, a diversidade linguístico-cultural dos surdos não era devidamente valorizada. Como a Sara refere, “(...) o ensino era feito como... como se nós fossemos ouvintes” (E, p. 1). Como ela salienta, embora já preconizasse alguma “sensibilização” para as especificidades dos surdos, o paradigma da integração não os valorizava devidamente, insistindo em normalizá-los, não desenvolvendo um currículo inclusivo e intercultural, isolando-os do contacto e da interacção com pares e adultos surdos, não lhes possibilitando desenvolver processos identitários consistentes, nem tão pouco aprendizagens linguisticamente mediadas, apelando simultaneamente à LGP e à Língua Portuguesa. Com estas formas de actuação, dificultava a inclusão escolar e social (Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2012). O isolamento escolar e social a que a normalização e a integração vota os surdos, impediu esta estudante de ter acesso atempado à LGP, bem como a outros sistemas linguísticos estruturados, cujos impactes nas aprendizagens académicas são expressos em diversas vivências de exclusão escolar, como o insucesso académico, levando-a a vivenciar, pelo menos, quatro retenções, bem como ao abandono escolar precoce. Como refere, “(...) não percebia o que os professores diziam (...) estava mesmo sozinha. Estava sozinha ” (Sara, E, p.5 ).

Tal como alguns pares, a Sara contactou e apropriou a LGP tardiamente, “aos “12/13 anos” (E, p. 14), de modo maioritariamente informal, em contextos externos à família, que no caso era ouvinte e não falante de LGP. Isso aconteceu essencialmente nos espaços e tempos informais nas escolas que frequentou, nos intervalos, no bar da escola ou na Associação Portuguesa de Surdos (APS), em interacção com os pares e com adultos surdos significativos e falantes de LGP, o que dificultou o desenvolvimento de processos metalinguísticos e metacognitivos próprios das aprendizagens formais de uma língua (Freire, 2011; Vygotsky, 1934/1962). Como refere, nos espaços e tempos de educação formal, a Sara ou era a única estudante surda ou, não o sendo, a LGP não só não era reconhecida ou valorizada pela cultura dominante da Escola, como era proibida. Salienta que começou, tardiamente, a apropriar a LGP numa das escolas de ensino regular orientada para a educação de surdos, de tradição oralista, que frequentou “com os colegas. Antes não. Era proibido língua gestual. Oralismo puro” (Sara, E, p. 14), ou não o sendo, os professores, que eram ouvintes,

50 Sara – Não falavam LGP e nunca tivemos intérprete. (...) Também, eu não sabia o que era um intérprete. Só mais tarde. Só mais tarde é que eu soube o que era um intérprete. Entretanto, já tinha passado o meu tempo, claro. Na altura não sabia. (Sara, E, p. 4).

Não menos importantes são os impactes do acesso tardio e pouco estruturado a sistemas linguísticos adequados às características dos surdos, como a LGP, na apropriação da língua portuguesa, na suas vertentes oral e escrita, impedindo-os de se afirmarem como indivíduos multilingues ou, pelo menos, bilingues, bem como de realizarem transições consistentes entre línguas e culturas (Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2010, 2012). Corroborando os resultados de outros estudos desenvolvidos noutros contextos sobre a literacia apresentada pelos surdos portugueses (Amaral & Coutinho, 2002; Baptista, 2008), os relatos da Sara, na entrevista que nos concedeu, denunciam as dificuldades que a Escola e as sociedades ainda vivenciam em propiciar aos surdos o desenvolvimento de literacia nas línguas faladas nas culturas em que estes participam:

279 Investigador (I) – Hum, hum. Tem mais... tem mais facilidade em falar língua gestual ou portuguesa? (...)
282 Sara (S) – Mais facilidade não. Igual. Igual. Língua gestual e língua portuguesa. Também há falhas, mesmo... É normal. Tenho falhas quer a nível da língua gestual quer a nível de oralidade.
283 I – Quais são as principais falhas na língua portuguesa?
284 S – Há palavras mal articuladas. Há palavras que as pessoas não percebem o que eu quero dizer e eu tenho que repetir.
285 I – Mas é na escrita ou na oralidade?
286 S – Ai na escrita... . Não... Não escrevo bem.
287 I – E a ler?
288 S – É assim, ler eu até percebo. Tenho mais dificuldade na escrita, mas esforço-me. Por vezes, troco a ordem... a ordem das palavras. Por causa da língua... do sistema gramatical da língua gestual. Não tenho culpa. (Sara, E, p. 14)

De realçar, no final deste excerto, que a Sara reconhece que as dificuldades que experiencia, do ponto de vista linguístico, não são culpa sua – devem-se às suas características auditivas – o que revela que internalizou alguns mecanismos de intra-empowerment, que a levam a assumir as suas características sem sentimentos de culpa. No entanto, como veremos no questionário e na TIP1, isso já não acontece, ou seja, a Sara parece capaz de recorrer a mecanismos de intra-empowerment quando usa LGP, mas não quando recorre à Língua portuguesa escrita, onde se sente mais desconfortável. Este exemplo ilustra bem a importância dos estudantes surdos terem acesso a poder comunicar, em contexto escolar, na língua em que se sentem mais fluentes, pois é nessa situação que são capazes de usar mais recursos internos, como os mecanismos de intra-empowerment, o que favorece os seus desempenhos.

As resposta apresentadas pela Sara no Questionário revelam um nível semântico, sintáctico e pragmático diferente do esperado para os pares ouvintes, como é habitual acontecer em surdos profundos e severos, a quem foi vedado o acesso atempado a sistemas linguísticos estruturados, como a LGP, dificultando o seu empowerment

Fig. 1 – Resposta elaborada pela Sara, Questionário

As dificuldades sentidas por esta estudante na apropriação da língua portuguesa impediram-na de desenvolver mecanismos de intra-empowerment (César, 203a), pois estes são internalizados a partir dos mecanismos de inter-empowerment, que os professores dela e a família não parecem ter usado frequentemente, em relação a estas aprendizagens, como iluminam os sentimentos de desconforto e de “vergonha” (DB), expressos no excerto da TIP1 – Para mim a escola é...:, em que ela afirma não ser “boa a escrever”, mas simultaneamente opta por não desenhar, possibilidade que também lhe era oferecida e que, geralmente, numa escola de ensino artístico, é particularmente apreciada pelos estudantes.

Fig. 2 – Excerto TIP1 da Sara

Retomando o excerto da entrevista à Sara com que iniciámos os resultados, diremos que nos possibilita evidenciar ainda um outro paradigma que, num tempo e num espaço mais recentes, parece ter configurado a trajectória de participação ao longo da vida desta estudante, em contexto escolar, fazendo-a sentir-se “bem”. Como ela realça, “Eu sinto me bem. É positivo. É positivo sim porque, de facto, trabalho, também, com ouvintes e a... e é bom haver uma colaboração” (Sara, E, p. 2). Esse paradigma é o da inclusão, cujos princípios apontam para a valorização da diversidade apresentada pelos surdos, dando-lhe voz e poder, mas permitindo-lhes aprender em conjunto com os pares ouvintes, em escolas do ensino regular. Ainda que a Escola e as sociedades manifestem algumas dificuldades em o desenvolver, ele possibilita a emergência de cenários educativos e sociais mais acolhedores da diversidade dos surdos, levando a que vivenciem sentimentos de conforto e de empatia pela escola, conseguindo realizar aprendizagens com sentido:

Fig. 3 – Excerto da TIP1 da Sara

Tendo abandonado a Escola há cerca de 20 anos, a Sara reconhece na opção de a ela regressar uma (outra) oportunidade de empowerment, sublinhado, que a conclusão do 12.º ano de escolaridade a vai ajudar a ter um futuro pessoal e profissional “melhor” , porque poderá “progredir na carreira” (Sara, E, p. 7). Desocultando as razões do regresso à Escola, relatou:

112. S – Colegas meus também estão a estudar. Não tinham o 12.º ano. E foram eles que, de facto, me... me... não foi bem pressionar, mas foram eles que me disseram para também voltar a estudar para ter progressão. Portanto, eu percebi quando os meus colegas, quando os meus colegas também estavam a pedir para volta... autorização para voltarem a estudar, alguma coisa se passava. Hoje em dia, ninguém é nada sem o 12.º ano. Antigamente era o 9.º. Hoje é o 12.º. Portanto, eu fiquei com essa preocupação e, de facto, quero terminar o secundário. (Sara, E, p.7)

Como a maioria dos pares surdos e ouvintes participantes nesta investigação, a Sara é estudante-trabalhadora, tendo abandonado precocemente a Escola por motivos económicos, bem como por pensar e sentir que a Escola não respondia adequadamente às suas necessidades, interesses e características. Como evidencia este excerto da entrevista, são as exigências de certificação académica que a levaram, já na idade adulta, a voltar à Escola, reconhecendo com ela a oportunidade de projectar um futuro mais promissor, porque, como refere,  (Sara, Q, p. 1). Mas, porquê esta escola?

99 Investigador (I) – Então, agora, vamos falar um bocadinho desta escola, está bem? Porque decidiu vir para o ensino nocturno?
100 Sara (S) – Eu, quando frequentei o 10.º ano, quando faziam... quando terminei o 10.º, depois da parte do estágio, nós conseguimos, logo, arranjar colocação. Comecei a trabalhar. Mais tarde é que pensei voltar a estudar. E não há outras escolas onde aceitem surdos. É difícil.
(...)
115 J – Por exemplo, se a Sara tivesse três escolas à escolha, continuava a escolher esta?
116 S – (...) Eu procurei e não havia outras escolas. De facto, era esta a única que eu podia frequentar.
117 Intérprete [para S] – Mas ele está a perguntar se houvesse outra escola?
118 S – Se houvesse eu, possivelmente, eu procuraria, mas aqui tem de ser a mesma escola. Tem de ser esta escola.
119 I – Mas porque é que a Sara diz que esta era a única escola para onde ela podia vir?
120 S – Porque é a única que tem apoio a surdos... a alunos surdos. As outras não têm apoio a alunos surdos e, por isso, seria mais difícil para mim. É assim, havendo apoio é possível que eu tenha uma boa evolução. Agora, sem apoio é mais difícil. As outras escolas não tinham apoios e não queria que os professores começassem a olhar para mim a dizer que eu que era uma aluna chata, que os estar sempre a chamar por não perceber. (Sara, E, pp. 7-8)

Sublinhe-se que, tal como os pares que participaram neste estudo, a Sara vivia a uma distância considerável desta escola, tendo-a escolhido não tanto pela oferta educativa que lhe era própria, o ensino artístico, mas por ser, como refere, a única com apoios especializados para surdos, um aspecto que lhe parecia ser essencial para ela ter acesso ao sucesso escolar. Isso fez com que se sentisse acolhida nesta escola, particularmente pelos professores que já não a estigmatizavam, discriminavam ou marginalizavam, sublinhando

Fig. 4 – Resposta elaborada pela Sara, Questionário

O modo acolhedor como a escola recebe a Sara, não a impede de lhe reconhecer algumas fragilidades, particularmente relacionadas com a formação pouco adequada de alguns professores, que os impede de desenvolver um currículo multilingue e adequado às características dos estudantes surdos. Esse descontentamento é descrito no excerto da TIP1 da Sara (Para mim a escola é...):

Fig. 5 – Excerto da TIP1 da Sara

Este excerto alerta-nos para a importância que a formação adequada dos professores e de outros agentes educativos assume na inclusão dos estudantes surdos, particularmente a relacionada com a apropriação da LGP, bem como com conhecimentos sobre a cultura surda, possibilitando-lhes desenvolverem competências profissionais que possibilitem práticas próprias de um currículo inclusivo e intercultural, realizando transições entre línguas e culturas. Cumpre-se, assim, um dos imperativos da educação inclusiva de surdos: responder adequadamente à diversidade apresentada pelos surdos, tal como evidenciado por nós noutro estudo e noutro contexto (Melro, 2003, 2014, Melro & César, 2010, 2012). Como a Sara sublinha, urge que os professores desenvolvam uma consciência ética e epistemológica, afirmando-se enquanto agentes educativos inclusivos e propiciando um processo de ensino e de aprendizagem de qualidade, destinado aos estudantes surdos.

O Pedro

O Pedro é um jovem adulto surdo, tendo 23 anos de idade na altura em que decorreu este estudo. Assumindo-se como bilingue, é filho de pais ouvintes e apresenta uma surdez pré-lingual bilateral de grau profundo, que foi diagnosticada por volta dos três anos, como nos informou na entrevista (E). Quando lhe perguntámos como é que se sentia por ser surdo, respondeu-nos com um ar convicto:

245 Pedro (P) – Sinto-me bem. Sou eu. Tenho [filhos], tenho amigos, divirto-me. Às vezes, vou viajar durante as férias e serve um pouco para eu... para me ajudar a sentir melhor. Não, eu... mas eu não... não... É assim, eu sempre fui habituado a ser surdo. Não sei escrever muito, mas sei escrever uma palavra ou outra. Se não for aquela palavra, se a pessoa [ouvinte] não entender o que eu escrevi, eu aponto, eu faço qualquer coisa.
246 Investigador (I) – Que vantagens é que o Pedro pensa que tem em ser surdo?
247 P – Há mais surdos. Posso conversar com eles. É assim, se eu vivesse isolado era diferente. Os meus amigos são convidados para ir à minha casa ao fim de semana. Convidam-me para eu ir a casa deles. E conversamos em língua gestual.
248 I – Se o Pedro pudesse deixava de ser surdo?
249 P – Não. Estou habituado. É assim. Estou habituado. Claro que sou surdo e é algo irreversível. É normal. (Pedro, E, p. 13)

O modo positivo com que se auto-representa, internalizando representações sociais positivas sobre os surdos, bem como a forma como assume as interacções sociais que desenvolve com outros participantes da cultura surda, levam-no a assumir-se como participante legítimo. Contudo, quando refere a participação na cultura ouvinte, bem como o tipo de interacções sociais que aí desenvolve, contrasta com os modos como interage e participa da cultura surda. Referindo-se-lhe como uma cultura oral e grafo-orientada, pensa-a, sente-a e vivencia-a como espaços e tempos pouco confortáveis, experienciando barreiras à comunicação e à participação legítima. Como refere, “Não sei escrever muito, mas sei escrever uma palavra ou outra. Se não for aquela palavra, se a pessoa [ouvinte] não entender o que eu escrevi, eu aponto, eu faço qualquer coisa” (P, E, p. 13).

As barreiras à inclusividade vivenciadas por este estudante, denunciam as fragilidades sentidas pelas sociedades em se afirmarem como inclusivas e interculturais, não valorizando devidamente as culturas vulneráveis e minoritárias, como as surdas, nomeadamente as línguas que assumem como maternas. Impedese, deste modo, a emergência de cenários educativos e sociais interculturais, bem como a equidade nas oportunidades de participação legítima ou na realização de transições consistentes entre línguas e entre culturas, levando, como sublinha o Pedro, a formas de participação periférica. Não menos importante é a forma como este estudante percepcionava o ónus das barreiras linguísticas e comunicacionais que vivenciava nas interacções sociais que configuravam a sua participação na cultura ouvinte. Internalizando e reproduzindo o que Lane (1997) designa por psicologia dos surdos, este estudante assume, no excerto acima transcrito, a noção fortemente enraizada na Escola e nas sociedades de que, pelo menos parte do ónus das dificuldades e barreiras vivenciadas nas trajectória de participação ao longo da vida, são da responsabilidade de determinadas características pouco valorizadoras dos surdos como, por exemplo, serem incapazes de serem fluentes numa língua e de comunicação. No entanto, quando refere as formas de actuação e de reacção desejáveis para as ultrapassar, o discurso apresentado aponta para a necessidade de as sociedades e a educação valorizarem a diversidade dos surdos, favorecendo o seu empowerment e possibilitando-lhes equidade nas oportunidades de participação legítima, em contextos escolares, e profissionais. O disempowerment originado pela incapacidade das sociedades desenvolverem formas de actuação e de reacção que possibilitem aos surdos desenvolverem mecanismos de inter- e intra-empowerment (César, 2013a), com impactes nos baixos níveis de literacia por eles apresentados na LP falada e escrita, são iluminados pelos seguintes relatos.

317 Investigador (I) – O Pedro já ouviu esta... esta afirmação do Fernando Pessoa. Dum poeta...
318 Intérprete – [Para o I] Ele não sabe quem é Pessoa.
319 I – Dum poeta... dum poeta... “A minha pátria é a língua portuguesa”.
320 Pedro (P) – Não... não...
321 I – E se lhe pedir se percebe o significado dessa frase “A minha pátria é a língua portuguesa” ...
322 P – Quer dizer que é... É assim, o português, nós falamos... Sim. Quer dizer, eu nasci em Portugal, é a minha... é a minha nacionalidade e que, no meu caso, eu preciso de aprender mais o português. É assim, eu não vou sair de Portugal, não vou para outro país da Europa trabalhar, não é? Eu vou... quero continuar em Portugal e, para isso, preciso de aprender melhor português. (Pedro, E, p. 16)

Este excerto mostra que, mesmo perante um poeta que desconhecia, o Pedro foi capaz de interpretar a frase e que lhe atribuir um sentido, nomeadamente questionando a necessidade de falar LP, uma vez que pretende continuar a viver em Portugal. Curioso é observarmos que a interpretação daquela frase o faz reconhecer a necessidade de aprender mais LP, uma vez que o poeta associa a LP a ser português, algo que não é de estranhar se pensarmos que, na época de Fernando Pessoa, não se relacionava o ser português com o falar LGP. Assim, este excerto mostra, de uma forma nítida, como o currículo, para ser inclusivo e intercultural, tem de considerar a aprendizagem situada e, além disso, discutir a participação à luz do que aceitamos hoje como socialmente desejável, algo que é distinto do que se considerava eticamente desejável no início do século passado, como esta frase de Pessoa tão bem ilustra. De salientar, ainda, como seria desejável que, a par com os poetas que escreveram em LP, se estudassem também poemas elaborados em LGP, para dar uma importância e visibilidade semelhante às duas línguas e às duas culturas. Num outro contexto, César (2013b) descreve como estas dinâmicas regulatórias podem ser essenciais para o acesso ao sucesso escolar de alunos que participam em culturas vulneráveis, que em geral são socialmente pouco valorizadas.

É também importante analisarmos os termos em que o Pedro é descrito no plano educativo individual (PEI):

Fig. 5 – Excerto do PEI do Pedro

Como podemos observar, o disempowerment que configura a participação deste estudante na sociedade maioritariamente ouvinte é reproduzido na Escola. Realce-se o carácter deficitário e monocultural que subjaz à descrição que, no PEI, é feita do Pedro. Esta ilustra que a trajectória de participação ao longo da vida deste estudante é dominada pelas barreiras à participação escolar, enquanto participante legítimo (César, 2013a; Lave & Wenger, 1991). Como as sociedades, a Escola reproduz, crenças, estereótipos, preconceitos e representações sociais negativas, pouco valorizadoras dos surdos, levando-a a percepcioná-lo como linguisticamente pouco competente, tanto em LGP como em língua portuguesa, o que dificulta a apropriação de conhecimentos e a comunicação com os pares e com os professores, ouvintes e não falantes de LGP. Estas representações sociais são configuradas pelos discursos de agentes educativos que, como ilustra este excerto, consideram o insucesso escolar e social dos surdos inevitável, remetendo-os ad eternum para formas de participação periférica (César, 2013a; Melro, 2014; Melro & César, 2009, 2010, 2012). Face a esta situação, perguntamos: Não será dever da Escola, que se quer inclusiva, contribuir para a emergência de representações sociais mais positivas sobre os surdos, valorizando-os nas especificidades que apresentam, contribuindo para o desenvolvimento de atitudes, de formas de actuação e de reacção facilitadoras da inclusão e da equidade? Para quando a Escola assumir-se como espaço e tempo acolhedor da diversidade dos surdos evitando o desenvolvimento de sentimentos como os relatados pelo Pedro no excerto seguinte?

43 Investigador (I) – E qual é a pior recordação que o Pedro tem da escola até chegar aqui?
44 Pedro (P) – Mesmo assim, os professores serem um oralismo... terem só o método oralista. Eu estive 11 anos na [nome de cidade onde frequentou a escola até ao 6.º ano de escolaridade] e, de facto, 11 anos para mim foram horríveis.
(...)
46 P – Da 1.ª classe até... Creio que da 1.ª ao 6.º ano [concluído, aos 16 anos de idade]. Eu não percebia nada. Do 6.º ano passei para a [nome de escola regular, direccionada para a educação de surdos]. A partir daí é que, de facto, eu comecei, a pouco e pouco, a aprender qualquer coisa.(Pedro, E, p. 3)

A contrariar a carga deficitária, pessimista e fatalista da representação social que alguns agentes educativos construíram sobre o Pedro, bem como as vivências de discriminação, de segregação e de exclusão que subjazem à trajectória de participação ao longo da vida escolar, durante a frequência do ensino regular diurno, está o seguinte excerto da entrevista:

1 Investigador (I) – Gostava de perguntar ao Pedro se é estudante-trabalhador.
2 Pedro (P) – Sou sim.
3 I – Trabalha em quê?
4 P – (...) trabalho para a [nome da instituição]. Trabalho em... em parte de propaganda. Portanto, faço os trabalhos a nível de informática, faço os trabalhos de publicidade, de propaganda (...).
5 I – Há quanto tempo exerce essa profissão?
6 P – Em Agosto irá fazer seis anos. É assim, mas três anos estive em formação. A partir desses três anos estive mesmo já de uma forma profissional e efectivo.
7 I – Como é que conseguiu arranjar este emprego?
8 P – Como...?! Como assim?!
9 I – Se foi por anúncio, se conhecia lá alguém...
10 P – Foi através da Associação Portuguesa de Surdos. (...) Estive três anos na... em formação e só depois é que fiquei efectivo na [instituição onde trabalha] (...).
(...)
17 I – O Pedro gosta daquilo que faz?
18 P – Sim.
19 I – Porquê?
20 P – Para já é um trabalho que é fácil e que eu tenho jeito para construir um cartaz. É algo que se faz rapidamente e que eu gosto de fazer. Portanto, é criativo. É um trabalho criativo.
21 I – O que é que o Pedro gosta mais no seu trabalho?
(...)
26. P – Gosto de tudo. Não há nada que eu possa dizer que... O que é mais complicado, de facto, é que eu tenho um pouco mais de dificuldade. Mas não se pode dizer que eu não goste disto ou daquilo” (Pedro, E, pp 1-2 ).

Se dúvidas houvesse sobre as capacidades e competências linguísticas desenvolvidas pelo Pedro, a segurança e a pregnância deste excerto diluí-las-ia. Saliente-se a complexidade do discurso apresentado, em LGP, por este estudante, recorrendo a formas argumentativas estruturadas e fundamentadas, questionando-nos e esclarecendo-nos sobre a actividade profissional que desenvolve, bem como o mérito que lhe é reconhecido. Assim, perguntamos, poderia alguém a quem a Escola condena a realizar aprendizagens académicas “muito, muito rudimentares”, estigmatizando, discriminando, excluindo, apresentar um percurso profissional caracterizado pela responsabilidade, pela exigência, pelo rigor, pela criatividade, bem como por esta realização pessoal e profissional? Como pode a Escola contribuir para o empowerment dos surdos se continua a destinar-lhes um futuro pouco valorizador da diversidade que os caracteriza? Não seria dever da Escola, que se quer inclusiva, valorizar as potencialidades de todos em vez de, como refere Freire (1970/1987), as oprimir?

Os impactes de uma Escola opressora, que estigmatiza, discrimina e exclui, configuram a trajectória de participação ao longo da vida do Pedro, levando-o a assumir que a Escola é um locus marcado pela dificuldade e pelo insucesso, como ilumina o excerto acima transcrito, assim como a TIP2, Ser aluno surdo é...:

Fig. 6 – TIP2 do Pedro

Como podemos observar, tal como ocorreu com a Sara, também com o Pedro a Escola monocultural, a Escola áudio-fono centrada (como refere, “muita fala”, “palavra mil”), a Escola madrasta (“é um professor muito Má”), a Escola do currículo culturalmente hegemónico (“são professores igual falar muito falar”), falhou nos seus propósitos: normalizar os surdos, oralizando-os, reabilitando-os.

Este excerto possibilita evidenciar que, tal como ocorria com a Sara, bem como com outros pares participantes neste estudo, as competências linguísticas em Língua Portuguesa mobilizadas pelo Pedro iluminam que, desde muito cedo (aos 3 anos de idade), a família, a Escola e a sociedade não souberam desenvolver práticas que facilitassem a apropriação de ferramentas culturais fundamentais ao sucesso académico e social, como a leitura e a escrita, bem como a apropriação da LGP – língua com a qual só contactou quando já tinha 17 anos. Sublinha, também, a importância de se construírem cenários sociais e educativos que facilitem desenvolvimento de interacções entre pares, contribuindo para o desenvolvimento de processos identitários consistentes e com sentido. Realça, ainda, a necessidade de as famílias e a escola propiciarem o acesso a um currículo multilingue, adequado às características, aos interesses e às necessidades dos surdos, possibilitando-lhes o desenvolvimento atempado de mecanismos de inter- e intra-empowerment (César, 2013a). Por último, destaca, a necessidade de as sociedades e a Escola se afirmarem como inclusivas, pondo cobro a vivências como as que configuram a trajectória de participação ao longo da vida escolar do Pedro, relatando-as do modo seguinte:

40. Pedro (P) – (...) os professores eram maus. Obrigavam-me.. e era um ensino era oralista. Sofri imenso. Enfim, não falo mais disso. Depois passei para... aos quatro... para os quatro anos fui para uma escola de... (...) de ouvintes. Depois estive nessa escola 11 anos... 11 anos integrado. Mas eu não percebia. Eu não percebia. Estava ali com os ouvintes mas não percebia nada. Aos 17 anos entrei para a escola [nome de escola do ensino regular, com experiência em educação de surdos] e ali sempre já era melhor. Havia intérprete. E, de facto, foi a primeira vez, eu nunca tinha visto até um intérprete. E desenvolvi muito a comunicação. Enquanto que aqueles anos todos que eu estive no [nome de uma localidade] nunca desenvolvi a comunicação. Às vezes... Foi um pouco difícil. Terminei o 9.º ano. Não fui estudar mais. E, depois, arranjei emprego. E, depois, pensei que a nível de conhecimentos e os meus colegas também me disseram para eu fazer o 12.º ano. E, de facto, vim para aqui à noite. Pronto e espero concluir o 12.º. (Pedro, E, p. 3).

Este relato ilumina o sofrimento, o isolamento, a frustração com que são confrontados os estudantes surdos quando os professores e o sistema de ensino não estão preparados para os receber. Como ele afirma, foram 11 anos em que estava nas aulas e não percebia nada e, se pensarmos quantas horas de aulas existem por semana, percebemos a resistência que é preciso ter para continuar a ir à escola, nestas condições. Num pais onde a escolaridade é obrigatória, urge que o acolhimento dos diversos alunos, de acordo com as suas características, também seja considerado algo imprescindível, algo obrigatório. Não se pode exigir a ninguém que esteja na escola, se esta não lhe fornece condições que lhe possibilitem aprender.

Denunciando os impactes escolares e sociais do oralismo, próprios do paradigma da integração, que pressupunha a normalização dos surdos, a persistência e a resiliência que caracterizam o Pedro fez com que, seis anos depois de, tal como a Sara, por razões económicas, ter abandonado a Escola, a ela regresse na convicção e na esperança de construir futuro pessoal e profissional mais promissor. Como refere,

Fig. 7 – Resposta elaborada pelo Pedro, Questionário

São a resistência, a persistência e a resiliência que o fazem sentir que:

Fig. 8 – Resposta elaborada pelo Pedro, Questionário

Como salienta, para que o sucesso académico e social seja possível, os professores têm de ajudar, mas ele tem de lutar por aprender as palavras que lhe permitem comunicar e realizar aprendizagens com sentido, bem como ter acesso a mais oportunidades de sucesso social. Mas também a Escola e as sociedades, diríamos nós, devem lutar para que aos surdos sejam propiciada equidade no acesso a uma educação de qualidade, fazendo com que a inclusão seja uma experiência possível, não mais permitindo que aconteça situações como as relatadas pelo Pedro no excerto seguinte:

169 Investigador (I) – Quando o... quando o Pedro veio para esta escola, como é que se sentiu?
170 Pedro (P) – Senti que era muito difícil a disciplina de Português. Logo eu senti que havia ali qualquer coisa e não me senti bem. Sentia-me angustiado com a disciplina de Português. Depois, de Desenho... sentia-me angustiado. Com o passar do... do tempo, no 2.º período, houve ali uma mudança e senti-me menos angustiado.
171 I – E quais eram essas dificuldades que o Pedro sentia?
174 P – É assim, eu tentei mas não... eu não... não... não fui habituado a escrever Português. Portanto, era assim, eu apenas copiava sem saber o significado das palavras. Só a partir dos 17 anos é que eu tive alguma... alguma aprendizagem. E, agora, estas aprendizagens que estou a fazer mas foi pouco tempo de aprendizagem. Eu não tive aprendizagens... desde o 1.º... a 1.ª classe, o 1.º ano, que nós tínhamos ali palavras, palavras, palavras... Eu lembro-me. Palavras, palavras, palavras, palavras. É assim, eu não aprendi. Eram apenas palavras, mas para mim não tinham nenhum significado. E, pronto, foi um trauma com que fiquei. (Pedro, E, p. 9).

Como denuncia o Pedro, urge que a Escola cumpra o dever ético e político de se afirmar como inclusiva, desenvolvendo uma praxis intercultural, mediando as aprendizagens na língua que mais se adequa às características dos surdos, valorizando a sua diversidade e propiciando equidade nas oportunidades de sucesso académico e social.

Considerações Finais

Em contextos educativos de inclusão, a afirmação de cenários educativos e sociais que propiciem aos surdos equidade no acesso a uma educação de qualidade exige que a Escola assuma práticas que lhes permitam assumir voz e poder. O regresso à Escola dos surdos adultos que precocemente a abandonaram deve oferece-lhes a oportunidade de (re)desenharem percursos pessoais e profissionais mais bem conseguidos, onde sejam confrontados com mecanismos de inter-empowerment, que possam depois internalizar, transformando-os em mecanismos de intra-empowerment. Significa também uma oportunidade para a Escola não mais repetir práticas pouco inclusivas, próprias dos paradigmas da normalização e da segregação dos surdos, afirmando-se como inclusiva e intercultural.

A Escola deve acolher os surdos, valorizando a diversidade linguístico e cultural que os caracteriza, de que o reconhecimento das línguas gestuais como legítimas é exemplo. Porém, não basta reconhecer. É preciso participar, comunicar. Por isso, se os diversos agentes educativos de escolas de referência para surdos não falarem LGP, a participação dos surdos fica comprometida, pois estes não conseguem comunicar com muitos dos que detêm mais poder naquela instituição. Assim, exige-se à Escola e às sociedades que desenvolvam uma praxis intercultural que propicie aos surdos acesso a um currículo multilingue, permitindo-lhes realizar aprendizagens consistentes e com sentido, facilitando a participação legítima nas culturas em que participam. Contudo, este estudo evidenciou que a Escola, em geral, e mesmo esta escola, em particular, ainda insiste em práticas monoculturais e etnocentradas que, ao afastarem-se do paradigma da inclusão, perpetuam o estigma, o preconceito, a segregação, a discriminação e a exclusão que ao longo dos séculos tem configurado as trajectórias de participação ao longo da vida dos surdos, particularmente as referentes ao contexto escolar. Por isso mesmo, é essencial ultrapassar o fosso entre os ideais, expressos em alguns documentos de politica educativa (ME, 2008; UNESCO, 1994) e as práticas, que tantas vezes não subscrevem as sugestões emanadas desses mesmos documentos.

Como evidenciámos, a Escola inclusiva e intercultural, a Escola acolhedora e valorizadora da diversidade dos Surdos, deve pôr cobro ao daltonismo linguísticocultural que configura muitas das vivências escolares dos participantes neste estudo. Isso pode ser conseguido dando oportunidade a que as aprendizagens dos surdos sejam mediadas nas línguas em que se sentem mais confortáveis e nas quais têm mais probabilidades de realizarem aprendizagens com sentido, permitindo-lhes assumir voz e empowerment. No entanto, esta investigação mostra-nos que, para que esses cenários sejam construídos, é urgente derrubar barreiras, devendo os diversos agentes educativos actuar de forma consitente, contribuindo para que a exclusão ceda à inclusão. A Escola deve propiciar a construção de cenários educativos e sociais que facilitem percursos pessoais e profissionais mais inclusivos e equitativos a quem a Escola e a sociedade não soube, ou não quis, em tempo oportuno e atempado, acolher e incluir.

Notas

Este artigo é uma versão mais aprofundada do texto escrito para o III Congresso Internacional, “Educação Inclusiva e Equidade”, organizado pela Associação Nacional de Docentes de Educação Especial (Pin-ANDEE), que decorreu no Instituto Piaget de Almada, Almada, Portugal, entre 31 de Outubro e 2 de Novembro de 2013 e que se encontra publicado no respetivo livro de actas, Melro & César (2013).

2 APEDECA - Associação de Pais para a Educação de Crianças Deficientes Auditivas.

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